Análise: B. B. King afirmou a cultura de um povo

“Eu acredito que há um lugar para tocar guitarra. Há um lugar para cantar o blues.” B. B. King

b-b-king

Qualquer modelo para afirmação de uma identidade precisa do seu herói. Nesse caso, o blues norte-americano construiu uma lenda. A diferença entre essas duas facetas é que a primeira parece necessitar de certo caráter artificial, enquanto a segunda é inteiramente popular. Não é novidade que qualquer povo reprimido resiste, sobretudo, através de sua cultura. Por isso a importância da preservação de costumes indígenas e africanos no Brasil. Da capoeira à mandioca existe algo que nos liga diretamente ao blues. De origem negra, como o samba, o ritmo sofreu com a segregação explícita nos Estados Unidos, que motivou a famosa frase de Miles Davis: “Só existe a música erudita europeia, a música popular brasileira e a música negra americana”.

B. B. King, que dizia fazer “uma nota valer por mil” foi a síntese do orgulho negro; nos Estados Unidos, no Brasil, na África e no Oriente. Como todo artista que amplia as conotações políticas, a magia de sua música se estendeu por esse país sem fronteiras: onde a alma e o sentimento residem, na valorização da vida, em que o homem é parte da natureza, não o seu detentor, e convive com a diversidade e a crença na semelhança igualmente. Natural do sul dos Estados Unidos, Riley Ben King perdeu o pai, que fugiu, e a mãe, que morreu, aos 8 anos. Esses acontecimentos típicos nas plantações de algodão da época foram superados quando o garoto recebeu uma guitarra do primo. Longe da fazenda, adotou o codinome pelo qual ficaria conhecido no mundo inteiro.

O mito se cristalizou quando o Blues Boy enfrentou as chamas para salvar Lucille, guitarra que ganhou batismo em homenagem à mulher que provocara a briga e o incêndio entre os dois pretendentes apaixonados. E não parou por aí. B. B. King, que dizia sempre “querer mais”, também tocou em homenagem a Martin Luther King, assassinado pela intolerância racista no país, e em outras ocasiões se apresentou ao lado de Jimi Hendrix, abriu shows para os Rolling Stones, além de parcerias nos palcos com James Brown, Michael Jackson, e até em evento para celebrar a cultura negra no Zaire, na luta entre os boxeadores Muhammad Ali e George Foreman. Para completar, King presenteou pessoalmente o Papa João Paulo II no Vaticano com uma guitarra.

Logo, o poder de sua música era conferido especialmente nas performances ao vivo, uma característica do blues, canção originada do coração, da dicotomia entre o consolo e a desolação, amargura e força, a esperança e a dor. Embora parecesse um herói e o tenha sido para milhões de pessoas em todo o planeta, Riley Ben King, garoto que tinha influência no canto gospel das igrejas protestantes americanas, conseguiu unir consciências em torno de um desejo só. A lenda da música negra americana transcende ao ideal humano. 15 prêmios Grammy e 15 filhos são o legado palpável de B. B. King. Quando a música toca e sua guitarra desfia os primeiros acordes há um número de sentimentos incalculável. Como se aquele momento valesse por mil, até mais.

B.B. King In Concert - San Rafael, CA

Raphael Vidigal

Fotos: Divulgação.

Compartilhe

Facebook
Twitter
WhatsApp
LinkedIn
Email

Comentários pelo Facebook

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Recebas as notícias da Esquina Musical direto no e-mail.

Preencha seu e-mail:

Publicidade

Quem sou eu


Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

Categorias

Já Curtiu ?

Siga no Instagram

Amor de morte entre duas vidas

Publicidade

[xyz-ips snippet="facecometarios"]