O escritor dos silêncios

“Tudo aquilo para que temos palavras é porque já ultrapassamos.” Nietzsche

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Nunca sequer disse uma palavra. Seus livros eram páginas em branco. Emanava.

Não alcançara nada porque sempre esteve todo. Chegara ao ponto máximo. Almejado por todos entre todos os escritores, sem nunca ter pronunciado: Não tinha o que dizer.

Não utilizava palavras, conjunções verbais, imagens, sons, metáforas, linguística, gramática: Ultrapassara.

Não sorria. Não denunciava arguições. Jamais recorreu a argumentos. Sua indagação era. O silêncio. Suas respostas eram. O silêncio. Suas sugestões, mentiras, verdades, concílios, arames, eram. O silêncio.

Vendia, é verdade. Era ouvido, é verdade. Divulgado, é verdade. Não escrevia, mentira. Não falava. O silêncio.

Pontos de interrogação, exclamação, final na testa. Não havia. Não possuía cara. Rosto. Feições de gesso. O silêncio.

Impregnado entre linhas do barulho imediato e repetitivo: repetia a ausência inexistente do silêncio.

Pausas. Respirações. Vírgulas. Elidia. Suspense.

Não se preenchia (os espaços) porque não esvaziava (a condição exposta). Não se calava, nem emitia juízos pontais. O silêncio.

Ganhou prêmios, indicações, leitores e fãs (muito diferentes entre ambos). Mas não por se vender se entregar amansar-se ao mercado.

Não tinha jeito. Tremeliques, intuições, profecias. Nunca ouve. O silêncio soprando ao vento do outono inverno primavera verão. Estações sucediam o silêncio.

No livro. O silêncio. Título: O silêncio.

Si lente. Nota musical num reflexo transparente:

E eis aqui um texto fraudulento, frustrado e furto; embotado de palavras intrusas, se estendeu a sirene.

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Raphael Vidigal

Publicado originalmente no blog “O Ovo Apunhalado” em 17/12/2011.

Desenhos: “Mãos Desenhando”, de Escher; e um cartum de Saul Steinberg, respectivamente.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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