Evaldo Braga foi ídolo ‘brega’ e morreu no auge do sucesso

*por Raphael Vidigal

“Se chego, riem mais alto os regatos,
Brinca a brisa mais travessa;
Por que então, olhos meus, vossa névoa de prata?
Ó claro dia estival, por quê?” Emily Dickinson

Os mais novos o associarão a anúncios publicitários. Os antigos, a sucessos de rádio. É possível afirmar que mesmo quem não ligue o nome à pessoa certamente conhece a voz de Evaldo Braga. É ele quem entoa os versos: “Sorria, meu bem, sorria!/Da infelicidade, que você procurou/Chorar, pra quê?/Chorar/Você deve sorrir/Que outro dia será bem melhor!”.

Morto há 4 décadas, em 31 de janeiro de 1973, num acidente de carro, aos 25 anos, o cantor colecionou êxitos que, ainda hoje, ocupam lugar de destaque na preferência dos brasileiros. É o que revela o radialista Acir Antão, apresentador do matinal ‘A Hora do Coroa’, na Itatiaia. “As músicas dele estão entre as mais pedidas do programa, rivalizando com Nelson Gonçalves”.

POPULAR
O caráter popular da obra de Evaldo Braga, facilmente identificada com o estilo considerado ‘brega’, é, de acordo com o crítico Mauro Ferreira, responsável por sua permanência. “O povão não se influencia pelo pretenso ‘bom gosto’ ditado na mídia, e é muito fiel a seus ídolos”. Como exemplos, cita o número de cópias vendidas por Roberto Carlos no mais recente EP e os shows, sempre lotados, do grupo Roupa Nova.

Jornalista e produtor musical, Thiago Marques Luiz tece considerações acerca da figura do cantor, que viveu em meio a boatos de abandono e dificuldades financeiras. “Diziam que ele imitava o Agnaldo Timóteo, mas o Evaldo era mais exagerado, não só no vestir, como no gestual”. Quem acessar o Youtube poderá conferir diversos vídeos em que, trajando o habitual vermelho, o cantor apresenta-se no Cassino do Chacrinha.

EFÊMERO
“Ele teve uma passagem efêmera, mas muito marcante na música brasileira”, avalia Acir Antão, que diz lembrar-se da data de falecimento do músico “como se fosse hoje”. “Por ter vivido na rua, ele formou um temperamento explosivo. Tinha acabado de fazer um show em Belo Horizonte, brigou com a namorada e, apesar do apelo de amigos para voltar outro dia, decidiu tomar o rumo de casa”, conta.

O acidente fatal ocorreu na BR-3, estrada entre Juiz de Fora e Rio de Janeiro, quando o veículo do compositor, dirigido por seu motorista, chocou-se com um caminhão ao tentar a ultrapassagem. No documentário “O Ídolo Negro”, produzido por Armando B. Mendes Filho em 1997, o ex-jogador Dadá Maravilha relembra o convívio e as brincadeiras entre eles: “A gente se provocava mutuamente, eu o chamava de ‘pato rouco’, ele dizia que eu era ‘perna de pau’”.

LINHAGEM
Evaldo Braga e Dadá Maravilha conheceram-se no Serviço de Assistência a Menores do Rio de Janeiro, precursor da FEBEM, onde, por razões diferentes, passaram parte da infância e adolescência. Dadá praticara um pequeno furto. Evaldo era órfão de pai e mãe. Um de seus maiores sucessos, “Eu Não Sou Lixo”, manteve viva uma polêmica, desmentida pelo irmão do compositor, de que teria sido abandonado no lixo por sua mãe.

Antônio Braga afirma, no documentário “O Ídolo Negro”, que Evaldo não chegou a conhecer os pais genéticos, apesar do desejo, e que fora entregue na porta de casa, enrolado e dentro de um cesto. A linhagem artística do cantor também é debatida no filme. Dadá Maravilha conta que a maior inspiração para Evaldo Braga era Cauby Peixoto, de quem, gradativamente, se distanciou, tomando posto no nicho mais exagerado da música romântica.

MARGINAL 
“O Flávio Cavalcanti dizia que ele parecia louco, pois gritava muito”, confidencia o irmão. Acir Antão compara o estilo de Evaldo Braga ao de cantores como Odair José, Amado Batista, Carlos Santos, Ronaldo Adriano, e outros. Para ele, a essência do artista era de “letras simples e uma rítmica que podemos chamar de ‘batidão’, músicas que, se fossem gravadas hoje, certamente seriam sucesso, pelo alto poder de comunicação”.

Mauro Ferreira endossa as palavras do apresentador, e acrescenta: “É um ídolo à margem, surgido nos anos 60, na ‘era de ouro’ da música brasileira”. O jornalista considera que Gal, Bethânia e Caetano, ‘fina flor da canção para a intelectualidade’, jamais chegaram às diversas camadas sociais da população com a força, proporcional à falta de prestígio junto à crítica, de Evaldo Braga. “E ele enfrentou o racismo, por ser negro, numa época de preconceito latente”, conclui.

Capa

Publicado no jornal “Hoje em Dia” em 21/01/2013.

Compartilhe

Facebook
Twitter
WhatsApp
LinkedIn
Email

Comentários pelo Facebook

5 Comentários

  • Ele sempre explicitava sua origem pobre em suas músicas, como em “Eu não sou lixo”… Em sua época seu sucesso beirava o de Roberto Carlos… Sou mais novo que sua morte, mas adoro suas músicas.

    Agora que tive tempo de ler a matéria completa. Meus parabéns, ficou muito completa e atingiu todos os pontos da vida dele. Parabéns pela genialidade, muito bom mesmo!

    Resposta

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Recebas as notícias da Esquina Musical direto no e-mail.

Preencha seu e-mail:

Publicidade

Quem sou eu


Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

Categorias

Já Curtiu ?

Siga no Instagram

Amor de morte entre duas vidas

Publicidade

[xyz-ips snippet="facecometarios"]