Show: Acir Antão & Sarau Brasileiro

Noite de dança e lembranças enternece corações saudosos

Show História Oral e Musical de Belo Horizonte

A noite começou com atraso. Compensado pelo belo número que estava reservado aos que compareceram ao espaço ‘Centro e Quatro’ para ver e ouvir Acir Antão contar e cantar as histórias de Belo Horizonte. Acompanhado pelo grupo de choro ‘Sarau Brasileiro’, o show que estava programado para as 20h se iniciou às 21h, com a apresentação de um vídeo.

Estrelado pelo radialista farto de boas histórias e causos pontuais que traçaram a linha da nova capital mineira, como ele diz, ‘nascida sob a égide do novo’, em substituição à barroca Ouro Preto, o clima começou a esquentar com mornas passagens de lembranças que bafejam na nuca aquela saudade gostosa.

Ao se encaminhar para o centro do palco, Acir Antão inicialmente só ouviu os companheiros oferecerem ao público ávido de qualidade, a instrumental ‘Saudades de Ouro Preto’, composição de Antenógenes Silva e Edmundo Lys. O projeto ‘História Oral e Musical de Belo Horizonte’ começava a todo vapor. As reações já eram de rostos embasbacados e olhos pregados nos movimentos dos protagonistas quando a grave voz do interlocutor fez ressoar a ‘Terna Saudade’ de Anacleto Medeiros e Catulo da Paixão Cearense.

‘Jura’, de Sinhô, espalhada nas rádios mineiras inaugurais como a Guarani e a própria Rádio Mineira, pela maciez de gestos de Mário Reis, colou-se à romântica ‘Dorinha, meu amor’, escrita por José Francisco Reis, também lavra do repertório do conhecido ‘Bacharel do Samba’. Na seqüência, atacou-se a inspiradíssima ‘Só pode ser você’, do gênio Noel Rosa, feita quando da estadia do compositor em Minas, e a conclusiva ausência do Rio de Janeiro no momento da visita da amante Ceci.

‘Lágrimas’ de Cândido das Neves, o Índio, trouxe referência ao ‘Cantor das Multidões’ Orlando Silva, e abriu espaço na caixinha para a valsa. Mas o instante aguardado com justificada ansiedade seria o da entrada dos compositores da terra, genuínos, habitantes incontestáveis da história que se conta. Rômulo Paes, talvez o mais celebrado da primeira fase da música de Belo Horizonte, adentrou o recinto apresentando a todos ‘Sebastiana da Silva’, a mulata que desceu o morro pelo estribilho sonoro da rainha Dalva de Oliveira.

Em seguida, desfilou graciosamente a sua ‘Marcha das Flores’, parceria com Henrique de Almeida, ao que os casais se reproduziam cada vez mais na pista de dança improvisada pelo alarde, movida pela vontade. ‘Minha Belo Horizonte’ foi o pico e o auge de espaço reservado ao boêmio jornalista formado em advocacia, nunca tendo exercido, esta última em comunhão com Eli Murilo Cláudio.

Ainda Rômulo Paes, rechaçando em cada verso a sobriedade e levando aos altos holofotes a descontração e irreverência marcantes, ao soletrar os contrastes da histórica ‘Rua da Bahia’, feita em concubinato com o igualmente essencial Gervásio Horta, e a satírica ‘Camisolão’, hino que alcançou o status de dito popular, correndo na boca como osso de qualquer cachorro, reproduzindo fala de Paulo Vanzolini. Honra maior para a canção popular.

‘Maria e José’, prova brilhante do talento do compositor mineiro para eclodir a imensidão de certas verdades em conclusão sintética, composta com Antônio Pedro. ‘Buraco de Tatu’, trouxe para o centro da roda Jadir Ambrósio e Jair Alves, distintamente acompanhados pela profusão de giros e rodas de saias, malícias e movimentos perfeitos dos cavalheiros condutores.

‘Açucena Cheirosa’, de Rômulo Paes e Celso Garcia, rememorou o baião de Luiz Gonzaga que incentivou a dança nordestina na capital de Minas, além de reacender a chama mulherenga do primeiro compositor, famoso também por casos de namoradas. O último bloco recheou os instantes finais da noite com colagens de choro e samba salpicados de estrelas candentes, caídas, cadentes, elevando a cultura e batimentos do coração dos que se entregaram de braços abertos e pernas saltadas.

‘Praça Vaz de Melo’, de Celso Garcia e Jair Alves, ‘Adeus, Lagoinha’, de Gervásio Horta, ‘Bela Belô’, do mesmo autor e ‘Belo Caso de Amor’, chorinho de Geraldo Alvarenga letrado por Paulinho Pedra Azul são cacos de vidro coloridos que mesmo quebrados, juntos revivem um passado de glórias, hoje chamadas saudades.

Acir Antão e Sarau Brasileiro

Raphael Vidigal

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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