Entrevista: Marisa Monte

“e soaram no cristal dos mares
lábios azuis de outras sereias.” Cecília Meireles

O Que Você Quer Saber De Verdade

 

*por Raphael Vidigal

O furor provocado pela vinda da cantora Marisa Monte a Belo Horizonte pode ser percebido pela necessidade de se abrirem quatro sessões, nos dias 22, 23, 24 e 25 de novembro (todas com ingressos esgotados, esta última extra), para a apresentação da turnê “Verdade, uma ilusão” no Grande Teatro do Palácio das Artes.

A respeito do título da empreitada, a compositora admite que ele “propositadamente desmente o nome do disco (‘O Que Você Quer Saber de Verdade’), por este ser muito assertivo, resolvemos propor essa contradição, pois ela (a verdade) só existe quando não tem ninguém vendo, no íntimo. Se tiver alguém olhando, passa a ser versão” brinca.

PARCERIAS
Apesar de também ser retrospectivo aos 25 anos de carreira da intérprete e compositora descoberta por Nelson Motta quando Marisa estudava música lírica na Itália, o show vai priorizar no repertório as canções do último álbum.

Sobre as parcerias e músicas escolhidas que tematizam especialmente amor e tempo, afirma: “Jorge Benjor é um gênio, sou fã da sua originalidade. São poucos como ele, como João Gilberto (principal expoente da bossa nova) que inventam um estilo, firmam uma marca com tamanha propriedade.” O fato do compositor de “País Tropical” ser “sinônimo de brasilidade” também pesou na inserção ao repertório.

Além da canção “Descalço no parque”, autoria de Benjor, consta no roteiro música decorrente de união inédita com o guitarrista do grupo Los Hermanos, Rodrigo Amarante. “Já nos conhecíamos do Rio de Janeiro, mas nunca tínhamos feito nada juntos”, aliança.

O acaso se encarregou de reuni-los em Los Angeles, onde foram gravar uma faixa no disco ‘Red Hot + Rio 2’ (projeto sobre a conscientização da AIDS em homenagem à Tropicália), e ali nasceram os primeiros movimentos da música ‘O Que Se Quer’. A finalização da parceria aconteceu à distância, via internet, “aproveitando as benesses da tecnologia.”

TANGO
Um tango composto por Frederico Esposito e com versão em português cunhada por Haroldo Barbosa, lançado no Brasil em 1956 pela cantora Dalva de Oliveira, “Lencinho querido”, colou-se ao projeto “de maneira única”, afirma.

A canção mais destoante do tom pretendido para o disco caiu nos braças e na graça de Marisa Monte ao ser chamada para a inauguração do Teatro Bradesco em São Paulo, o qual faz questão de ressaltar como “belíssimo”, e na ocasião conheceu o produtor e cantor da terra de Evita, Gustavo Santaolalla. Foi este encontro que acendeu na voz do sucesso de “Amor, I Love You” a vontade de cantar uma música portenha “mas em língua nativa”, desenha.

No entanto, a escolha não foi tão fácil e direta. Após um trabalho de pesquisa, Marisa ficou em dúvida entre duas “pérolas do gênero. ‘Fumando Espero’ (famosa no registro do cantor argentino Carlos Gardel) foi a outra que ponderei gravar, pois traz em si, nos tempos atuais, uma incorreção política, de um comportamento que vem se tornando anacrônico e instigante”, diz.

A batida do martelo em favor de “Lencinho Querido”, aconteceu pela “pura intuição”. Por ter se colocado diante de uma escolha, a decisão era inevitável. Melodia e letra carregadas de nobreza, justificaram, para a intérprete, o registro.

SIMPLES
A influência de Roberto Carlos em músicas como “Depois”, presente no show e no disco, é recebida por Marisa Monte com um “talvez”, afinal esta relação é perceptível em vários momentos de sua obra. “Admiro a simplicidade do Roberto como conceito de valor. Embora eu mesma possa soar hermética, abstrata e menos acessível em alguns momentos”.

E acentua a identificação com a ‘Velha Guarda da Portela’ (participou de documentário sobre a escola de samba ao lado de Paulinho da Viola), e seus compositores mais famosos: Monarco, Candeia e Manacéia, este último autor de ‘Quantas lágrimas’.

CÁSSIA ELLER
O novo espetáculo reserva uma surpresa, despida do sentido de desconhecimento, para os que asseguraram ingresso. Além de referir-se à recepção de público e crítica com o adjetivo “excepcional”, a cantora esnoba intimidação por prováveis comparações com Cássia Eller.

O fato de cantar pela primeira vez em show a canção de sua autoria com Carlinhos Brown e Nando Reis, “E.C.T”, consagrada na voz ‘de trovão’ (diria Rita Lee) da propagadora do versos, seria o mote para uma rivalidade sadia, mas que não resvala em Marisa.

“Quando o intérprete registra uma canção com o vigor e a coragem da Cássiaele se torna dono e de alguma maneira toma posse dela. Irei fornecer a minha versão dos fatos, nada mais, como a verdade, uma ilusão”, diverte-se.

Escapando de competições ou disputas, a cantora define o fato como “uma oportunidade de me aproximar novamente da Cássia e expor para as pessoas a nossa relação, contar um pouco do nosso convívio”.

MMA
E a fantasia promete tomar os contornos da apresentação, com direito a projeções e quadros, deixando a música infiltrar-se por entre contribuições das artes plásticas, da dança e até da luta.

A presença de Anderson Silva (atleta de MMA) no clipe de “Ainda Bem” foi , de acordo com Marisa Monte “ideia minha. Meu marido é fã do esporte e o Anderson é um ídolo brasileiro, representante da força”.

A união de uma aparente brutalidade, “inexistente, pois o Anderson é um amor de pessoa”, à delicadeza da música e do feminino foi o que estimulou a cantora: “Sabia que seria algo diferente, até certo ponto, surpreendente”, finaliza.

Verdade, Uma Ilusão show

Publicado no jornal “Hoje em Dia” em 22/11/2012.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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