Noite de gala da dança argentina brinda os espectadores com atrevimento
Um rrrádio dos anos 40, e uma aura futurista. São os contrastes que conduzem o espetáculo da companhia argentina ‘Tango-a-Tierra’, dirigida por Gillermo Salvat e Silvia Grynt. Como nos pares que se lançam, cruzam, entrelaçam, cortam, masculino e feminino, com tesoura cega: os sentidos do corpo mais aguçados.
Logo ao abrir das cortinas, um suntuoso conjunto brinda-nos em posição de ataque, anfitriões da casa, tomam posse de seus instrumentos e servem aos convidados doses nada moderadas de melodia e cordas que sossegam a madeira, adormecem o bandoneon e submetem a sinfonia a uma metáfora de creme.
Para abalizar o confronto entre o passado e presente, começam o rito batucando no rigoroso violoncelo, estabelecendo assim o ponto para a enseada posta ao deslize dos primeiros bailarinos. Sensualidade de pernas espichadas, lívidas e nuas que balançam entre o parceiro.
Tragédias, dramas, fotos repetidas em preto & branco vermelham a ingratidão propagada por amores desfeitos, recompostos na sumarenta transposição que sibila ao ar um grito de água fervente. Pra cá e pra lá a entressafra culpa a fruta da estação, pecado, gangorra: maçã.
Entre transmissões de jogos de futebol, pausa para a dança cubana estrelada pelo afetuoso garçom, rispidez e laivos de sonolência e paixão, as mulheres sacodem os homens nos botecos a repaginar repentina aventura vivida com ardor e luxúria.
Luva jogada ao alto pela dama, e o cavalheiro recolhe-a furtivo, a espreitar o perfume contido em pedaço de pano. Quando entra o cantor desbravando injúrias, proezas, duma extensão vocal de causar inveja a Carlos Gardel e Francisco Alves, com o mesmo charme. Desmedindo esperanças e agüentando calúnias, entrega-se ao perdão da fossa, a solidão culpada.
No segundo momento, há a exuberância, círculos de fogo colocados no alto como bambolês soltos, livres, aves: mulheres em palmas de mãos, pontas dos pés, calam nos calos, a irregularidade e metamorfose que o corpo é capaz capataz de adquirir voraz. Homens chutando bolas invisíveis como quem colhe do pé de jabuticaba o doce gosto natural. O Palácio das Artes edifica a beleza, entra em transe.
Pena serem bailarinos com vidas fora do palco, família a criar a cuidar sustentar, horários, obrigações e honorários, burocracias que não escapam nem ao artista vulgar, perene, socorro. Caso contrário, lhes obrigariam a dançar eternamente, em memórias e lembranças numa lousa que não se apaga.
Raphael Vidigal
14 Comentários
Oi Raphael,
Estou emocionado com seu site, muito bom! Mas estou sentindo uma falta estrutural da Angela Ro Ro… Desculpa a chateação, mas a Ro Ro é muito linda pra ficar de fora… Vou te mandar alguns videos dela pra te inspirar… quem sabe dá certo!?
Muito obrigado, Daniel! Sou fã da RoRo! Tenho quase toda a discografia e já vi todos esses vídeos! Incrível voz mesmo! Potente e debochada, adoro. Só que aproveito as datas de aniversário ou show. Caso contrário, não dou conta. É muita coisa acontecendo na área cultural. hehehe, o aniversário dela é só em dezembro!! Mas se tiver algum show antes com certeza escrevo. Mais uma vez obrigado pela presença no site e pelos vídeos. Grande abraço!
hehehe, assim que é bom!! …entendi sua logística, muito boa! Fico esperando Dezembro então! Abração e Parabéns de novo!
Nao sei o pq, mas lembrei da Lais German….hehehe
Muito, muito booooooooom mesmo!
Descreveu de tal maneira que foi como
se eu estivesse assistido o espetáculo.
Gostei demais e vou mostrar para o Eduardo,
pois ele vai amar.
Bom dia e beijos,
M.Inês
Muito obrigado, Maria Inês! Contentíssimo pelos elogios. Beijos
Lindíssimo espetáculo!!! Vc descreveu maravilhosamente…Parabéns! Beijos…
Obrigado, Fátima! =)
Elis! https://esquinamusical.com.br/elis-regina-30-anos-de-saudade/#more-6
Obrigado por divulgar, Daniel Coscarelli!
O que é bom não precisa divulgar… corre sozinho!
Grato! ^^
Oi Raphael,
Agora que M.Inês me mostrou, ficamos
sem luz o dia todo.
Você escreve muito bem, menino!
Tenho acompanhado suas crônicas e
seus poemas que acho muito bons.
Parabéns, temos muito orgulho de você.
BJS,
Eduardo
Agradeço muito, Eduardo!
Fico lisonjeado. Abraços