Crítica: Tímida, “Cássia Eller” explode em direções diversas em “O Musical”

“Eu poderia ser um monge do Nepal
Um jardineiro, um marinheiro, etc e tal
E não há nenhuma outra hipótese que eu não considere, mas
O que eu queria mesmo ser é a Cássia Eller” Péricles Cavalcanti

CASSIA ELLER O Musical_DIV_Marcos Hermes-2

É difícil, num musical cheio de méritos, apontar um só. Então vamos por partes, como sentenciou Jack. Figura lendária na história da música brasileira, principalmente na renovação da imagem do rock a partir dos anos 1990, Cássia Eller tem a sua trajetória contada em espetáculo dirigido por João Fonseca, o mesmo de Cazuza, com a ajuda fundamental de Vinícius Arneiro na mesma função e outros nomes importantes, como Gustavo Nunes, que idealizou e produziu a empreitada, Lan Lan, percussionista que namorou e trabalho com Cássia, na direção musical, Fernando Nunes, outro que conviveu com a protagonista, na codireção musical, e Patrícia Andrade, responsável pelos textos. Mas entre tantos brilhos individuais a cena é dos atores.

Cássia Eller, mimetizada por Tacy de Campos, que já fazia cover da cantora antes de estrelar a peça, entra de costas, em escolha acertada que logo de saída apresenta traço importante de sua personalidade: a timidez excessiva, ou até, quem sabe, certo desinteresse e enfastiamento de convenções sociais. Convenções estas que a intrépida artista fazia questão de colocar abaixo quando, no palco, transformava-se numa poderosa Cássia pelo simples poder de sua voz, nem eram precisos atos extremos que, vez ou outra, apareciam, como a mania de exibir os seios que a marcou anos depois. Mas tudo isto, fica claro, sempre foi muito mais fruto de uma espontaneidade genuína e duma criança indígena que cultivou em si do que atos mercadológicos.

Cássia passava longe de tais atitudes, e a pressão desse meio, também fica nítido, foi um combustível poderoso na imersão cada vez mais profunda da cantora em comportamentos pouco recomendáveis à saúde. Aliás, a faceta criança, desprotegida, despreparada e irresponsável é bem demonstrada sem apontamentos morais, com naturalidade. Incapaz de lidar com o cotidiano prático e situações rotineiras, ela encontrou em mulheres importantes esse aconchego, especialmente Maria Eugênia, companheira de toda vida, e a mãe. A força da história de Cássia Eller, sua vida unida umbilicalmente à prática artística é acentuada pelo desempenho magistral dos intérpretes, que migram de personagem para outra com tal facilidade que de imediato convence a plateia.

Emerson Espíndola compõe um divertidíssimo e muito peculiar Nando Reis. O mesmo vale para Thainá Gallo, como Moema e Lan Lan, Glicério Rosário, impagável como Oswaldo Montenegro e Fernando Nunes, Eline Porto, hipnotizante como Maria Eugênia, Jana Figarella, ponto de equilíbrio e desequilíbrio na vida inconstante de Cássia, e Evelyn Castro, espetacular como mãe, amante e otras cositas más. Menção honrosa e destaque para a banda que acompanha a trupe. Mais enxuto em iluminação, cenários, duração e atores do que Cazuza, o grande mérito de Cássia é dividir as atenções do espectador. Se em “Cazuza” a luz fica praticamente toda sobre o protagonista, muito em função, certamente, da personalidade deste, Cássia Eller, mais discreta, explode em direções diversas.

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Raphael Vidigal

Fotos: Marcos Hermes.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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