Crítica: “Rosa Choque” é peça-manifesto inteligente e necessária

“Longe daquele leito ameno
Somos um sonho que eles sonham.
Suas pálpebras retêm sombras.
Nada vai lhes acontecer.
Trocamos a pele e nos movemos
Dentro de um outro tempo.” Sylvia Plath

Rosa Choque discute questões de gênero

Se a “brincadeira” que marca o início do espetáculo soa repetida e familiar é porque fala, justamente, do quão atual e sério é o tema tratado. A pertinência do conteúdo é envelopada com fina e, ao mesmo tempo, penetrante camada estética, direcionada para seu redor como uma lâmina. “Rosa Choque” consegue abordar questões repisadas na contemporaneidade sem permitir que sua ânsia e clamor percam o viço e a força. Ao contrário, entre a representação e a performance, a dramaturgia fechada e a interativa, oferece uma peça-manifesto que traz em seu bojo fatores que permitem uma nova reflexão, porque condensada através de concepção estética que é direta e também simbólica. Nisso a direção é sagaz em combinar os elementos que tem a seu dispor para que seja reforçada a fineza textual. Figurino, cenário, luz, projeções e músicas contribuem para adensar as circunstâncias. E ainda surpreendem. Longe de prejudicar a fluência da trama, o experimentalismo acalora as cenas.

A entrega dos atores a seus papéis diz do quanto a tomada de consciência aliada à disposição são capazes de gerar uma verdadeira modificação no espaço – do campo imagético ao simbólico – esse olhar para outro(a) pode, através de artes como o teatro levar-nos a nós mesmos, e a questionar, a partir daí, em que lugar estamos, se o desejamos e, por consequência, em que lugar colocamos A outra pessoa – ou será que ela se permite colocar? Essa é uma dentre as muitas questões fundamentais levantadas na exposição interpretativa ali presenciada. Tanto pela intimidade com o tema, quanto a vontade de chegar ao fundo em suas origens e consequências, ambas as interpretações realçam a urgência vista, sem nunca roçar o burlesco nem forçar a barra, sobretudo, e inclusive, quando expõe as próprias vozes, despidas de personagens, pois na procura por alargar as possibilidades e borrar os limites das definições torpes. Política, inteligente e necessária a peça-manifesto “Rosa Choque” é pra ontem.

Ficha técnica
Concepção, atuação, seleção musical, figurino e cenário de Cris Moreira e Guilherme Théo.
Direção de Cida Falabella.
Dramaturgia de Assis Benevenuto e Marcos Coletta.
Colaboração artística: Rogério Araújo/Criação audiovisual: André Veloso/Trilha Sonora original: Daniel Nunes (Lise)/Iluminação: Cristiano Araújo/Costureira: Sonia Moreira/Participação em vídeo: Andréia Quaresma/Participação voz em off: Raquel Pedras e Rogério Araújo/Produção e coordenação: Cris Moreira e Guilherme Théo/Realização: Coletivo “Os Conectores”.

Rosa Choque é protagonizada por Cris Moreira e Guilherme Théo

Raphael Vidigal

Fotos: Flávio Charchar.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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