“Você vem de um palacete,/Eu nasci num barracão,
Sapo namorando a lua/Numa noite de verão
Eu vou fazer serenata,/Eu vou matar minha dor,
Meu samba vai, diz a ela,/Que o coração não tem cor” Wilson Batista & Marino Pinto
É compreensível que num ofício predominantemente sonoro como a música o autor da palavra não receba a mesma atenção, sobretudo, de seus intérpretes, mas também dos instrumentistas. É desse mal que sofreu Marino Pinto, carioca nascido no interior do estado, então capital federal, embora tenha acumulado inúmeros sucessos quase sempre sob a égide do anonimato, por ser ele jornalista e responsável pelas letras, sendo que nunca se atreveu a cantar ou tocar algum instrumento em público. A saída prematura de cena, com apenas 48 anos de idade, ainda na década de 1960, provavelmente contribuiu ainda mais para que sua identidade se apagasse aos poucos da memória dos mais aficionados por música. A força de sua obra reside em que as composições continuaram a ser gravadas, por nomes como Ney Matogrosso, João Gilberto, Luiz Melodia, Elza Soares, Maria Bethânia, Alaíde Costa e até Norma Bengell.
Um dos bons medidores da importância e da qualidade do legado musical composto por Marino encontra-se no álbum “Magnífica”, lançado pela “Divina” Elizeth Cardoso em 1959. No disco em questão, a cantora se debruça apenas sobre títulos de Marino, criados, a maioria, com vários melodistas, desde Vadico, parceiro célebre de Noel Rosa, até Tom Jobim, demonstrativo da abrangência de estilos e relações sociais que era capaz de tecer. Seus temas preferidos, como ditava a época, versavam sobre amores que não deram certo, desfeitos ao sabor da mágoa e da paixão, quase sempre embalados pelo ritmo dolente, sofrido e acalorado do samba-canção. Mas também se espraiou sobre marchas irônicas e de exaltação, por exemplo, ao ditador Getúlio Vargas. São dele as letras, em parcerias com Herivelto Martins, de “Segredo” e “Cabelos Brancos”, assim como “Aos Pés da Cruz”, com Zé da Zilda, “Preconceito”, com Wilson Batista, “Teleco-teco”, com Murilo Caldas, sucesso de Isaurinha Garcia, “Renúncia” e muitas outras músicas que hoje são de todo mundo.
Raphael Vidigal
Fotos: Marino Pinto com a cantora Dalva de Oliveira; e retrato assinado, respectivamente, fontes de arquivo.