*por Raphael Vidigal
“Mas a minha linguagem é mais clara. Eu poderia te dizer aonde se entrecruza a lenta gramática e o teu sexo de gatas” Ana Cristina Cesar
Não deixa de ser espantoso que Wanderléa chegue aos 70 anos ainda como símbolo da música jovem e romântica. Mas muitos também irão se surpreender ao descobrir, a essa altura, que a musa da “Jovem Guarda” nasceu em Governador Valadares, no interior das Minas Gerais. Conservando até hoje o epíteto de “Ternurinha”, a artista se mudou cedo, aos nove anos de idade para o Rio de Janeiro, onde tudo acontecia culturalmente, mas não foi a única mudança ao longo de sua trajetória.
Talvez Wanderléa tenha permanecido justamente pelo paroxismo que permite aos clássicos o cotejo da imobilidade. Intérprete, sobretudo, de ritmos e gêneros altamente populares, a cantora soube conciliar aspectos de forte apelo emocional a uma elegância ao mesmo tempo comedida e ingênua. Sucessos como “Pare o Casamento” e “Foi Assim” poderiam facilmente sucumbir à banalidade se não recebessem o seu canto.
Longe de reproduzir a extensão vocal ou as interpretações dramáticas e acaloradas das cantoras da “Época de Ouro do Rádio”, como Dalva de Oliveira, Linda Batista, Elizeth Cardoso ou mesmo Maysa, Wanderléa pertence a um fenômeno novo, pois mais do que introduzir a influência norte-americana através do rock, a “Jovem Guarda” foi o primeiro estilo musical propriamente pensado para ser consumido como produto, de maneira industrial.
Daí porque seus componentes pareciam personagens, protagonizavam filmes, vendiam franquias e, especialmente, caprichavam no figurino. O fato de seus principais integrantes terem ultrapassado a febre do período deve-se à incrível capacidade de sobreviver na lógica de reciclagem e descarte que a mídia massificada impõe. Wanderléa e os que a acompanharam tiveram o mérito de se sobressair à estrutura plástica montada e criar canções com autenticidade.
Fotos: Divulgação e Arquivo.