“Humildade de amar só por amar. Sem prêmio
que não seja o de dar cada dia o seu dia
breve, talvez: límpido, às vezes; sempre isento.
Ir dando a vida até morrer.” Cecília Meireles
O título autoexplicativo não inibe a criatividade da Cia. Cena Alternativa. No espetáculo “Não existe vida no talvez”, levado à cena no Espaço Cultural Meia Ponta, a prerrogativa serve como disparador para que, através da dança contemporânea, os artistas desfilem sobre o tablado gestos nutridos de beleza e, sobretudo, necessidade. Há uma fina noção estética a conduzir todo o espetáculo que jamais se perde ou retrai-se, sendo responsável por marcar as movimentações sem com isto amarrá-las, vista tanto na escolha da trilha, a se acoplar com suavidade aos passos, quanto em outras opções fundamentais, preponderantemente figurino e cenário. Tanto isto que um se fundirá ao outro. Essa organicidade é observada junto a todos os elementos que compõe a dramaturgia, fato admirável quando se trata de tema tão vasto. Vastidão esta que não se ignora, mas, ao contrário, ganha amplitude pelos textos da dança.
Mas é a necessidade que marca, sobretudo, a montagem. Havendo uma concepção estética muito bem delineada para aparar as personagens, elas, ali, permeadas por luz e coragem, nos induzem a acreditar na história contada, numa linguagem subjetiva e simbólica, mas que nos olhares, nas posturas, nas distensões e colisões, no que se aproxima e separa, enfim, por meio de corpo que inspira, expressa e dispara, somos levados a considerar o movimento como a única alternativa válida. Logo, a inércia não será contemplada. Porque a contemplação falha. A pontualidade das palavras, que também buscam essa veia poética para além do mundo objetivo e prosaico, ajuda a amealhar para a peça novos fatores que reforçam sua natureza icônica de disparador; não ponto de chegada, sem prejuízo à sua narrativa lânguida. O que se percebe, aqui, é a dança como necessidade de sobrevivência, não material, mas abstrata. Já que a vida é criada. Estão abertas as possibilidades. E são várias.
Ficha técnica
Direção geral de Janaina Pedrosa.
Direção artística de Bruna D’Carlo, Helbert Pimenta e Janaina Pedrosa.
Direção coreográfica de Bruna D’Carlo e Helbert Pimenta.
Coreografia criada coletivamente.
Com Evelyn Baptista, Gabriela Furst, Hadassa Baptista e Thales Rocha.
Figurinos: Mariana Couto/Iluminação: Bruno Rodrigues/Trilha Sonora e Cenário: Cia. Cena Alternativa/Apoio: Núcleo Buritis Escola de Dança.
Raphael Vidigal
Fotos: Ester Teixeira.