Crítica: espetáculo “Nowhereland – Agora Estamos Aqui” incorre em excessos e não envolve espectador

“‘Gatos comem morcegos? Gatos comem morcegos?’, e ás vezes: ‘Morcegos comem gatos?’, pois, sabem, como ela não sabia a resposta para nenhuma das perguntas, tanto fazia a ordem que lhes dava.” Lewis Carroll

Nowhereland - Agora estamos aqui

Há boas referências ao universo do cineasta Tim Burton, que o coletivo “Movasse” se propõe a homenagear no espetáculo “Nowhereland – Agora Estamos Aqui”, como às personagens de Beetlejuice, Edward Mãos de Tesoura, Alice no País das Maravilhas, Sweeney Todd – o Barbeiro de Sevilha, e outros. No entanto, a primeira parte do título em inglês já é prenúncio do distanciamento com o público e a incapacidade de envolvê-lo com uma dramaturgia que se perde, confusa, quanto mais se pretende explica-la. A inserção de falas em meio à dança nada acrescenta, pelo contrário, gera momentos constrangedores e despropositados à montagem, como na cena em que uma das atrizes emposta a voz com grossura e depois dirige graças à plateia.

Por outro lado, há os belos e mínimos movimentos de dança que almejam expressar o esquisito, grotesco e incômodo do ser humano tanto explorado pela lente aguda de Tim Burton. Andréa Anhaia, Carlos Arão, Ester França e Fábio Dornas acertam seus chutes à meta. O instante em que uma das protagonistas despe-se externamente e depois do coração, o acompanhamento pelos braços da música ao piano e principalmente o delicado arrumar de cabelo num canto do palco, enquanto outros acontecimentos se sucedem, mostra que a atração tem acertos pontuais, o que não é o bastante para arrebanhar o espectador, que a esta altura, em razão dos outros erros do espetáculo, já tem a exata noção de que tudo não passa de teatro.

O que não deveria ser verdade, pois o grande mérito de Burton sempre foi criar um cenário, um clima, um casamento de contraditórios entre o fúnebre e o vivaz que ao final das contas não mais se distingue o grito de dor do de uivo. Sob direção artística de Sônia Mota, trilha sonora de Kiko Klaus, cenário da “Vermelho Steam”, iluminação de Márcio Alves e figurino de Silma Dornas, não há duvidas de que o coletivo tinha um grande desafio pela frente e se jogou a ele com ousadia, no entanto algumas opções se mostraram ineficazes, talvez se aparar os excessos e apostar em soluções menos pretensiosas o experimental ganhe ressonância e a dança mude de fato o batimento dos corações e o pensar das cabeças cortantes.

nowhereland-movasse

Raphael Vidigal

Fotos: Guto Muniz

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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