Zeca Baleiro: “O cenário artístico brasileiro é tomado de muita injustiça”

“Acabe com o apetite, e a geração atual não
Viveria um mês, e nenhuma geração futura existiria” Ezra Pound

No interior do Maranhão, em Arari, Zeca Baleiro ouvia discos de Martinho da Vila, Luiz Gonzaga e Mercedes Sosa. Antes mesmo de ser conhecido ele já tinha um ídolo: Fagner. O encontro dos músicos aconteceu quando o cearense foi levado pelo poeta Sergio Natureza a um show de Baleiro. “O que mais me instigou foi o fato de sermos de gerações diferentes”, afirma Baleiro. Juntos, os dois compuseram quase 20 canções, gravaram disco e DVD. “Até o conceito de geração está confuso. No passado, isso era uma afirmação de identidade estética e ideológica. Hoje, a ideologia é o mercado e a ideia de sucesso se antepôs a tudo”, lamenta Baleiro.

1 – O que o aproximou do cantor Fagner e como se deu esse encontro? Quem era o seu grande ídolo musical na infância e qual a sua primeira lembrança musical?
Sempre fui grande fã do Fagner, dos seus discos do início da carreira, alguns obras-primas. Fagner foi a um show meu no Rio, levado pelo poeta Sergio Natureza. Depois eu o visitei em Fortaleza, jogamos uma pelada, tomamos uma cerveja e então começou a parceria. As primeiras canções que fizemos são “Tempestade” e “Outra Era”, e estão num disco solo dele. Ouvi de tudo desde sempre em casa, discos de muzak (música de elevador), samba do passado, Roberto Carlos, Martinho da Vila, Elton John, Luiz Gonzaga, Mercedes Sosa etc. Depois, já adolescente, ouvi muito reggae e rock, coisas mais experimentais, rock brasil. Quando surgiu a oportunidade de parceria com Fagner, fiquei muito excitado com a ideia, a ponto de termos composto cerca de 20 músicas em parceria na época. O que mais me instigou foi justamente o fato de sermos de gerações diferentes. A possibilidade desse diálogo me encantou.

2 – Parece ter havido uma mudança na relação entre as gerações na música brasileira. Em determinado período ela foi de rompimento: bossa nova com samba-canção; Tropicália com bossa nova; rock com MPB, etc. E atualmente a reverência dos novos artistas aos antigos domina a cena. Na sua opinião, a que se deve isso?
Não há mais transgressão possível, acho. Não há com o que romper. Teses à parte, acho bom que haja reverência aos mestres, aos pioneiros. O cenário artístico brasileiro ainda é tomado de muita injustiça.

3 – O rompimento com gerações anteriores nunca foi exclusividade da música brasileira. Qual a importância desse tipo de movimento dentro de um território de reflexão como são as artes? E, na via contrária, o que a relação de reverência traz de positivo, quais são as principais contribuições que ela agrega?
Hoje, até o conceito de geração está confuso, né? No passado, isso era uma demarcação de território, uma afirmação de identidade estética ou ideológica ou ambas. Hoje, a ideologia é o mercado, e a noção de estética se perdeu, não são valores vigentes. A ideia de sucesso profissional se antepôs a tudo, infelizmente.

4 – Mais de uma vez você interpretou músicas consagradas de maneira diferente da original, como na clássica “Bola Dividida”, de Luiz Ayrão. Qual intenção primordial está contida nesses gestos?
Ayrão é uma grande figura. É um craque o homem, compôs canções que estão no imaginário de todo brasileiro, um gênio popular. A intenção é não deixar essas canções se perderem no tempo, nem seus autores. E há, na esteira disso, uma tentativa de colocar em discussão os conceitos de bom gosto e mau gosto, baixa cultura e alta cultura.

5 – Tem planos de gravar algum álbum em homenagem a alguém ou de atuar como produtor, como nos casos de Hilda Hilst e Sérgio Sampaio?
Tenho vários planos, de vários álbuns. Quero e pretendo gravar CD’s-tributos a Walter Franco, Sérgio Sampaio, Benito de Paula, entre tantos gênios da canção.

Raphael Vidigal

Fotos: Silvia Zamboni/Divulgação

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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