*por Raphael Vidigal
“palavras com asas curtas para seu corpo tão prenhe de significado” Virginia Woolf
Os meandros da construção literária de Virginia Woolf, nascida há 140 anos na Inglaterra, são sutis, sem, com isto, perderem a contundência, muito pelo contrário. É aguda a maneira com que a escritora analisa as suas personagens, em uma espécie de jogo duplo, onde o ambiente externo e seu detalhamento fornecem pistas sobre o que há de mais íntimo em cada um, e que lateja através de palavras escolhidas com o rigor e a métrica de uma ourivesaria. Virginia Woolf concebe suas histórias como verdadeiros quadros simétricos, em que a profundidade da cor, a tonalidade dos sentimentos, o espanto da paisagem, enfim, tudo contribui para que o essencial, ali, se revele.
Por exemplo, quando ela diz: “A pressão de seus dedos parecia aumentar na flor o que ela de mais brilhante continha; realçá-lo; torná-lo mais fresco, franzido, imaculado”, ou, “Parecia que tínhamos sido trancados todos juntos, tristes, solenes, irreais, numa bruma de emoção grave. Parecia impossível sair dali. Não era somente triste; era irreal. Tinha-se a impressão de um dedo pousado sobre os lábios”. É claro que a morte a atormentava. Perseguida por crises de depressão que os médicos não sabiam como tratar na época, a romancista cometeu suicídio em março de 1941, aos 59 anos, entrando num lago gelado, cheia de pedras nos bolsos. A imagem invoca mais ecos literários.
Livros como “Mrs. Dalloway”, “Orlando” e “As Ondas” se tornaram célebres e mereceram adaptações para cinema e teatro. Envolvida nas questões de seu tempo, Virginia abordou o feminismo – a seu modo – e as contradições de uma sociedade feita para subjugar a mulheres. No entanto, a despeito de uma rica elaboração social e política, o grande conflito de sua existência foi travado com ela mesma e os males da alma de um corpo que sequer compreende o sentido de si próprio, quanto mais dos que a rodeiam. Porém, Virginia realizou tal tarefa munida do gosto para o novo e a inventividade, o que, hoje, a tornou clássica. A escritora segue como uma das mais relevantes expressões da modernidade.