90 anos de Sylvia Plath: literatura poética entre a contenção e o desespero

*por Raphael Vidigal

“O que é tão real quanto o choro de uma criança? O grito de um coelho pode ser mais selvagem, mas não tem alma. E aí vem você com uma xícara de chá envolta em vapor. O jato de sangue é poesia, não há como estancá-lo. Você me entrega duas crianças, duas rosas.” Sylvia Plath

Sylvia Plath abreviou a vida aos 30 anos, mas, se estivesse entre nós, completaria no próximo dia 27 de outubro, nove décadas de existência. O suicídio que ela consumou, após colocar a cabeça sobre uma toalha dentro do forno de casa com o gás ligado foi, de alguma forma, antecipado em seu único romance e derradeiro livro, “A Redoma de Vidro”, finalizado pouco tempo antes e publicado postumamente, naquele ano de 1963. A protagonista é uma estudante de moda que ruma para Nova York, às voltas com questões íntimas e exteriores, como a inadequação a um mundo que relega às mulheres o papel de submissão. Existe o feminismo e suas nuanças, mas Sylvia Plath vai além.

O caráter autobiográfico fica claro em passagens como a internação da garota para curar a depressão por meio de um tratamento de choque ainda comum na época, trauma do qual a escritora jamais se recuperou. À medida que avança, o romance se torna cada vez mais perturbador, diante do labirinto emocional da personagem, e da falta de saída que se apresenta. Sylvia Plath é habilidosa em conduzir o leitor por dentro de suas questões mais tormentosas, e o desencanto com o qual ela se relaciona com a vida surge de maneira peculiar: é um desespero contido, que se expressa cruamente, mas sem derramamentos. Essa característica também é a marca dos poemas da autora.

Lançando mão de imagens pouco convencionais, Sylvia aborda a morte, o desespero, a putrefação, o suicídio, enfim, os temas de sua predileção, sem descambar para o exagero, ao contrário, pois ela preza, justamente, por uma exatidão que impressiona – e até assusta – pelo uso de vocábulos pouco utilizados, mas que contém, em si, igual poder de identificação junto a um universo de simbolismos nebulosos, obscuros, e que, em certa medida, trazem à tona o aspecto físico e concreto da existência. Ossos, cartilagem, unha, sangue, etc., se unem a uma “lua pálida”, em um verso de métrica livre, que cintila através da luz das trevas. Sylvia Plath é a expressão do desespero firme.

Foto: Site oficial/Divulgação.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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