Teatro: R & J de Shakespeare – Juventude Interrompida

“‘Hamlet’ seria Hamlet,
Inda que Shakespeare não o criasse,
E ‘Romeu’, embora sem mais lembranças
De sua Julieta,” Emily Dickinson

Romeu e Julieta

É bom conhecer lugares novos. Adentrar outros labirintos. Percorrer solilóquios horizontes, onde na imensidão o vazio e o silêncio ouvem vozes. Neste sentido, a peça ‘R & J de Shakespeare – Juventude Interrompida’, adaptação de Joe Calarco traduzida por Geraldo Carneiro e dirigida por João Fonseca, eleva o mérito.

Banalizando a densidade da história, de fato, pueril e ingênua, sem com isso perder a universalidade e franqueza, do romance entre Romeu e Julieta, o enredo carrega as tintas no humor escracho, focado nos dotes físicos dos atores para tais intervenções.

A falta de respeito com o convencional e tradicional é certamente o ponto alto deste espetáculo. No entanto, a concentração na desmistificação total com uso da graça sonora, praticamente exime o texto dito de atenção, soando na maior parte do tempo corrido e pouco importante se comparado ao ‘non sense’ que se destila.

Há momentos impagáveis deste absurdo palpável, como na interpretação da música “Rapunzel”, sucesso de Daniela Mercury que abona votos ao casal da trama, as patacoadas de Pablo Sanábio como a Ama e o sotaque do Frei Lourenço, além da empertigada Julieta, na pele de Geraldo Rodrigues.

Aliás, a homossexualidade é naturalizada de maneira que se esquece esse ingrediente nas cenas de amor e sexo protagonizadas por dois homens, ficando Romeu a cargo do galante João Gabriel Vasconcellos. Felipe Lima completa o elenco de quatro homens que se revezam, ora dando vida a mulheres, sempre personagens excessivamente moleques.

Os quatro atores, inclusive, transcendem o espaço da peça, e demonstram notoriedade para exalar talento em várias esferas. A iluminação de Luiz Paulo Nenen cumpre o papel com louvor, o figurino de Ruy Cortez e cenário de Nello Marrese surge pontual (provocando a idéia de mínimos recursos) enquanto a trilha a cargo de André Aquino e João Bittencourt caminha saltitante por clássica e contemporânea, entre o hilário, sublime e dispensável.

O tom juvenil e piegas chega a incomodar em determinados momentos. Mas o teatro provoca reações justamente extremas, que logo a galope a mesma pieguice é debochada e posta no patamar mais divertido da dramaturgia. Tudo é caricatural, e a opção por ignorar o bom gosto merece aplausos.

Ao final, o cômico já se impôs com devida impertinência que é impossível adensar a tragédia.  O entretenimento parece ficar em primeiro plano, mas é a ousadia do espetáculo que lhe legará posteridade.

Teatro brasileiro

Raphael Vidigal

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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