Cássio Scapin destaca-se em peça dirigida por Jô Soares
Chegar até o destino é um problema. Afinal, a filosofia oferece muito mais perguntas do que soluções. Essa é a função atroz reverenciada pelo humor de Jô Soares e seus dirigidos no espetáculo ‘O Libertino’, apresentado no teatro SesiMinas no último domingo.
Romance do dramaturgo francês Éric-Emmanuel Schmitt, a peça recebe contornos que aproximam o espectador brasileiro de uma realidade de época, fator por vezes aplaudido, mas que no meu julgo perde um pouco do charme da apresentação, tão bem disposto em roupas (ou na falta delas, no caso do ator principal Cássio Scapin) e cenário.
Parodiando a vida do filósofo iluminista Denis Diderot, brevemente explicada em vídeo pelo ator Juca de Oliveira, o material oferecido ao público é de fácil acesso sem cair, na maioria do tempo, na boçalidade ou no exagero, ao contrário, aposta na irreverência quase fronteiriça, mas mantendo com nariz em pé a inteligência dos diálogos e das colocações de duplo sentido.
A reflexão ressonante é primeiro: a do humor como forma de pensamento; e segundo: a incompreensão de sentidos em comunhão com uma massa volúvel que sempre escapa ao toque mais aflito e determinante dos dedos, deixando transparecer a subjetividade protuberante.
Questões como o sexo, casamento, filhos, intolerância, crimes, enfim, as relações humanas, são servidas na bandeja com interpretações das atrizes Erica Montanheiro (a fatia popularesca do enredo), Luciana Carnieli (boa presença física), Luiza Lemmertz (igualmente coadjuvante e correta) e Tania Casttello (abalizando o desespero consentido) a ciceronear Cássio Scapin (excelente em todos os números), guardado de perto pelo mordomo Daniel Warren.
A saga de Diderot para escrever o verbete ‘moral’ na Enciclopédia que, assim como as mulheres, tanto lhe consome o tempo, é bem costurada até o fim do espetáculo, quando uma sucessão de acontecimentos abre espaço inclusive de forma um pouco confusa, para discussões rápidas sobre bissexualidade.
Há também momentos impagáveis, como a ‘confissão’ do protagonista de ser judeu. No todo, ‘O Libertino’ passa o recado, propõe o riso e consegue atingir senão a maioria das cabeças da platéia, ao menos os maxilares rijos, bem mais distendidos e relaxados na saída dos portões.
Raphael Vidigal
4 Comentários
Adorei a peça! Nunca mais vou ver o “Nino” com os mesmos olhos. Hahaha…
Leu a crítica de teatro do Machado, certeza.
Agradeço aos comentários! Belíssima peça. Abraços
Descobri hoje uma caixa de spam aqui no face com várias mensagens que nunca cheguei a ler…Mas adorei a matéria. Obrigada!
Abs,