Show: Zélia Duncan (ToTaTiando)

“e eleva o peso do espaço
com todas as palavras não ditas” Luiz Tatit & Alice Ruiz

Totatiando

Na obra do artista plástico (escultor e pintor) Giorgio de Chirico, as coisas, muito além de pessoas, objetos ou asas (à imaginação), por isso o genérico de tudo, estão acopladas, transmutam-se, refratam e declamam a união como num campo magnético conduzido por imãs.

A arte de Luiz Tatit é igual, posto que difusa, e diferente, à reclusa recusa o elemento comum, congruente. O teórico que se intrometeu na ação fez questão de ungi-la a partir das conotações de verbo: a palavra desdobrada e aviltante, surpreendente – assustando – é o ás do baralho.

Na boca de Zélia Duncan, no sexo, nas inflexões ciliares, capilares, corpulentas, a dicção perfeita espalha sons, manhas, meios, tomando por base o poema de Mário de Andrade, alguns personagens, tidos por reais como Itamar Assumpção, a própria cantora, outros fictícios, quando na mentira (verdade?) ambos (que ultrapassam dois) se misturam.

O pequeno contingente de músicos alocado à esquerda do palco (Tércio Guimarães, teclado; e Webster Santos, guitarra), a saia de seda chinfrim, as letras em tamanho irreal, as luzes como iridescentes lustres a descer e subir segundo as palpitações de gesto, coração, destino, o cenário a empurrar Zélia Duncan para fora do universo imaginário, enquanto segura seus pés de palhaço.

Na travessia para o passado em Brasília, as lembranças, despidas, desprevenidas, até um pouquinho espremidas, insuflam a intérprete a atravessar o limite, ao que se espantamo-nos com uma calorosa atriz, entre fala e canto, fado e manto: uma Atriz.

Como se dá isso? Tantas deflagrações do impossível, do que transporta, ultrapassa, contradições tão óbvias? É por um momento apenas a paixão por Vera, Sofia, Odete (eterna espera) mas se não lhe ouvem as poesias e não é tempo disso porque estamos atentos, curiosos, omissos?

Resumindo: Zélia está chorona, irremediavelmente feliz, complexa, simples, e na procura por um fim lancinante, que se aproxime da sensação do espetáculo, estou perdido, sem nexo, deslumbrado, aflito, digo não digo? Reflito: é desnecessário o findo, pego emprestado o que o autor me dita: “Que um rei que não morre, e nunca envelhece, e que é vitalício, é só o reinício.”

Seguimos.

Zélia Duncan canta Luiz Tatit

Raphael Vidigal

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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