“pode escapar-nos, porventura, e desvanecer-se, porque não confiamos em fantasmas.” Virginia Woolf
A parafernália em torno de “O Fantasma da Ópera” justifica sua grandiosidade. Cumprindo a premissa dos musicais da Broadway, a nova versão brasileira do musical aposta numa estrutura que impressiona pelos atributos físicos. O cenário não deixa de destacar os itens que terão papel narrativo no desenrolar da trama, em especial o gigantesco lustre colocado sobre a cabeça dos espectadores. A reprodução de um coral de anjos e um brinquedo de um macaco instrumentista também chama atenção pela beleza dos objetos. A atuação da orquestra é outro ponto alto.
Mas, como de praxe, afora o que se impõe pela presença física ou sonora, todo o resto fica a dever. Um musical é, por mania, grandiloquente, ainda mais quando se encontra com o universo operístico. A expansão de gestos, vozes e cores é tamanha que chega ao nível da pirotecnia, o que não anula a capacidade do time de intérpretes líricos, em especial a do protagonista, cuja voz se destaca. Thiago Arancam compõe um Fantasma ao gosto dos fãs: ele toma a cena com vigor, pela força de sua garganta e a rudeza de seu gestual.
Dos demais intérpretes há dois destaques: Taís Vieira como a rígida professora de balé, que cria para si uma personalidade factível; e Sandro Christopher, que imprime humor ao espetáculo com ações mínimas, algo quase inexistente nas duas horas de duração da peça. A direção veleja meio sem saber se deve levar esse barco no arrastar macio das águas ou com a tempestuosa velocidade das ondas noturnas, determinando um ritmo confuso à atração. O que se constata de mais relevante, no entanto, é como essa história de sucesso já envelheceu.
Enquanto as letras não chegam a ultrapassar os clichês dos romances hollywoodianos, os diálogos revelam que, para além de um triângulo amoroso, estamos diante de uma relação doentia, que se convencionou chamar, nos dias atuais, de abusiva. O ciúme como justificativa para os atos mais criminosos é romantizado ao ponto de se transformar o vilão numa espécie de Corcunda de Notre-Dame, de quem nos apiedamos ao final. O livro de 1910 escrito por Gaston Leroux, onde o musical de 1986 se inspira, é um clássico ultrapassado.
Raphael Vidigal
Fotos: Lenise Pinheiro; e Pedro Dimitrow/Divulgação, respectivamente.