Centenários 2016: O Samba, Raiz Cultural do Brasil

“O Samba da minha terra deixa a gente mole/Quando se canta todo mundo bole
Quem não gosta de samba, bom sujeito não é/É ruim da cabeça, ou doente do pé
Eu nasci com o samba, no samba me criei/E do danado do samba, nunca me separei” Dorival Caymmi

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O samba já começou com um buchicho, pois ao contrário do que cantaria décadas depois a música de Evaldo Rui e Fernando Lobo sobre a tal “Nega Maluca”, todos se imputavam a paternidade da cria. Do estribilho para o muxoxo foi um passo, tudo porque a canção cantada aos milhares no terreiro de Tia Ciata foi registrada somente no nome de um par: Donga e Mauro de Almeida. Bem verdade que o segundo nunca fez muita questão do fato, ao contrário do primeiro. “Pelo Telefone”, gravada em dezembro de 1916 e lançada em disco Odeon recebeu assim a voz do cantor Bahiano e da Banda da Casa Edison. Tal como o samba que inaugurava morreu, ressuscitou e requebrou em diversas vozes, em períodos e com abordagens das mais variadas. Ainda naquela década teve por “cavalo” Almirante, e mais tarde nomes como Martinho da Vila, Beth Carvalho, Chico Buarque e Paulo Moura.

O samba, como samba, se fez em terreiro, vindo da África, batizado a partir de palavra que designava tradicional dança de Angola, que logo migrou, primeiro para a Bahia e depois chegou, também através dos escravos e seus descendentes, ao Rio de Janeiro, onde transformou-se em ritmo, estilo e até modo de vida, responsável por caracterizar seus músicos e cantores pejorativamente de “malandros”. É Martinho da Vila que atesta a importância de Noel Rosa nesse procedimento, “branco sem preconceitos que subiu o morro e trouxe o samba ao centro de todas as classes sociais”. Antes acostumadas com os estrangeirismos europeus da valsa e das canções italianas, passaram a cantar um gênero que se consagraria como a autêntica raiz cultural do Brasil, através de um caldo fervilhante de intensas misturas, a tal miscigenação que os modernistas chamariam de “antropofagia”. Nisto o samba se mistificou, criou raízes e deu novos frutos, por obra de sua amplidão.

Ismael Silva começou a transformar, no bairro do Estácio, o samba em escola para foliões, já que a maioria deles raramente tinha acesso às tradicionais, e iniciou subgênero que congregaria clássicos para a história nacional, tanto pelas vias de Heitor dos Prazeres e Lamartine Babo até Dona Ivone Lara e Silas de Oliveira, com os enredos e as marchinhas. O samba malicioso e quase falado, que antecederia o rap, ganhou pelas vias de Moreira da Silva sua expressão mais completa, traduzida como “breque”, justamente pautada pelo tempo, por interrupções que sublinhariam o sentido. Para os românticos haveria também a canção, ainda que samba, levada às alturas por compositores da estirpe de Herivelto Martins, Ataulfo Alves, Dorival Caymmi e tantos outros, guardando características próprias do Rio de Janeiro, das Minas Gerais e da Bahia, respectivamente. Isto sem falar em Cartola, Nelson Cavaquinho, Carlos Cachaça, cuja vida foi em samba do bochicho ao muxoxo.

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Raphael Vidigal

Imagens: “Samba”, pintura de Carybé; e caricaturas de J. Carlos, respectivamente.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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