10 músicas de Juca Chaves para rir e amar o Brasil

*por Raphael Vidigal

“Podeis crer que com a mais fervente devoção os vossos credores rogarão a Deus para que vos conserve a vida e vos livre da morte, tanto mais amam a manga que o braço e o dinheiro que a vida. Testemunham os usurários de Landerrousse, que há pouco tempo se enforcaram vendo o trigo e o vinho baixar de preço e o bom tempo voltar.” Rabelais

Juca Chaves nasceu no Rio de Janeiro, no dia 22 de outubro de 1938. Filho de um judeu austríaco com uma judia lituana, Juca Chaves se formou em música erudita e começou a compor ainda na infância. Suas trovas e modinhas logo fizeram sucesso nas décadas de 1950 e 1960, em que ele conciliava um estilo bem-humorado com melodias suaves. Em 1960, lançou o seu primeiro LP, “As Duas Faces de Juca Chaves”, já que, além de músico, ele também ficou conhecido como humorista. Entre seus maiores sucessos estão “Presidente Bossa Nova”, homenagem a Juscelino Kubitschek, “Brasil Já Vai à Guerra”, “Honestidade”, “O Menestrel” e “A Cúmplice”, regravada por Fábio Jr. A música foi originalmente lançada em 1974, no ótimo LP “Ninguém Segura Este Nariz!”.

“Águas de Saquarema” (canção, 1957) – Juca Chaves
Juca Chaves começou a aprender violão aos sete anos e, com a mesma idade, já demonstrava interesse também pela poesia. Com formação erudita, ele teve aulas como o renomado maestro Guerra-Peixe e também com Nair Medeiros. Nesse período, fundou o movimento da Juventude Musical Brasileira mas, ao longo de sua carreira, Juca renegaria ações coletivas e se colocaria, cada vez mais, em uma posição individual e independente. Do mesmo modo, sua primeira composição gravada seria oposta ao trabalho que ele desenvolveria na sequência. Foi em 1957 que a cantora Leny Eversong, conhecida pelas interpretações arrebatadoras com sua voz de largo alcance, lançou a canção “Águas de Saquarema”, uma composição de Juca exasperada e cheia de força.

“Presidente Bossa Nova” (samba-bossa, 1957) – Juca Chaves
A Bossa Nova ainda não havia colocado as mangas de fora, ao menos como movimento, nem sido devidamente batizada pelo cronista Stanislaw Ponte Preta, e ainda usava, portanto, calças-curtas, podemos dizer assim, quando Juca Chaves compôs o maior sucesso de sua carreira, que seria lançado em 1957. “Presidente Bossa Nova”, um samba cheio de bossa teve, segundo ele, primeiro a inspiração de Noel Rosa que, no samba “Coisas Nossas”, de 1932, aludia às bossas do Brasil. Inspirada na figura ao mesmo tempo elegante e descontraída do presidente Juscelino Kubistchek, a canção angariou uma gravação de Elis Regina, em 1980, mais de duas décadas após ser lançada, no espetáculo “Saudade do Brasil”, dois anos antes da morte da grande intérprete.

“Por Quem Sonha Ana Maria” (modinha, 1960) – Juca Chaves
Com passagens pela TV Tupi de São Paulo e tendo realizado saraus de poemas satíricos, Juca Chaves estreou em disco em 1960, com “As Duas Faces de Juca Chaves”. Nessa época, já tinha colocado alguns compactos na praça. Mas foi com esse LP inaugural que ele passou a ser reconhecido pelo grande público, graças a peças como a romântica “Por Quem Sonha Ana Maria”, segundo o próprio compositor inspirada em “uma menina gordinha, mas com uns olhos geniais”, prenunciando o seu estilo galhofeiro. A modinha consagrou-se como um dos hits de Juca, segundo o crítico musical Jairo Severiano, “meio superestimado nos anos de sucesso, entrou em declínio ao deixar de ser novidade”. E a música seria regravada por Agostinho dos Santos.

“Nasal Sensual” (sátira, 1960) – Juca Chaves
O apelido do craque virou sinônimo de excelência e habilidade. Nascido Edson Arantes do Nascimento na cidade de Três Corações, em Minas Gerais, Pelé conquistou o mundo. Literalmente, diga-se de passagem: ergueu três vezes a Copa do Mundo de seleções com a camisa brasileira, a primeira delas logo aos 17 anos, em 1958, na Suécia, jogando para as cucuias o tal complexo de vira-latas que Nelson Rodrigues expressara em palavras e eternizando a camisa 10. Com a bola nos pés, era um Rei em campo: negro, forte, rápido, habilidoso, bom na cabeçada potente tanto quanto em amaciar no peito a pelota como se feita de algodão. A predominância física sobre os adversários ainda lhe rendeu o epíteto de Atleta do Século. Juca Chaves o cita em “Nasal Sensual”, de 1960.

“Brasil Já Vai à Guerra” (canção, 1960) – Juca Chaves
A política brasileira voltou a estar no foco de Juca Chaves quando, em 1960, ele lançou a música “Brasil Já Vai à Guerra”, que satirizava a compra de um porta-aviões pelo governo brasileiro. Censurada, a canção só veio a público em 1962, em um LP que não perdia a ironia, batizado “As Músicas Proibidas de Juca Chaves”, lançado pela Odeon. De um limão, ele fez uma limonada, transformando a censura em piada a seu favor, numa típica jogada de marketing às quais se habitou ao longo de sua trajetória. A capa do disco trazia diversos recortes de jornais. Em 1960, quando lançou o primeiro álbum, Juca elegeu o viaduto do Chá, em São Paulo, “quinto degrau, lado esquerdo de quem sobe, um barril de chope, alguns sanduíches e o povo como convidado”.

“Caixinha, Obrigado!” (samba, 1960) – Juca Chaves
Vindo de São Paulo, embora nascido no Rio de Janeiro, Juca Chaves foi apresentado a Lamartine Babo, Tom Jobim e Vinicius de Moraes em um bar na capital carioca, ainda antes do futuro estrelato. Simpatizando com ele, Vinicius o batizou de “Menestrel Maldito”, pela verve polemista que já exibia. Em 1960, pouco antes de ser obrigado a exilar-se em Portugal e, depois, na Itália, devido às perseguições políticas que passou a sofrer, Juca colocou na praça o desaforado samba “Caixinha, Obrigado!”, em que pintava o Brasil com os traços caricaturais que melhor lhe cabiam. “A mediocridade é um fato consumado”, começava ele, na letra da música. Já em Lisboa, foi apelidado, pelo regime ditatorial de Salazar, de “O Trovador Maldito”, fazendo jus à fama…

“Autorretrato” (canção, 1960) – Juca Chaves
O renomado escritor irlandês James Joyce publicou, em 1916, o seu primeiro romance, intitulado “Retrato do Artista Quando Jovem”. Décadas depois, o poeta mato-grossense Manoel de Barros lançou o “Retrato do Artista Quando Coisa”. Juca Chaves também compôs a sua espécie de autobiografia, com a música “Autorretrato”, em que, com seu estilo galhofeiro e descontraído, ele pinta a sua própria vida, definindo-se, logo nos primeiros versos, como “simpático, romântico, solteiro, autodidata, poeta, socialista”. Mais à frente, afirma-se como milionário, antes de se desmentir como um artista “duro e sem dinheiro”. A música foi gravada no LP “A Personalidade”, de 1960, em que a divertida capa lançava os rostos do compositor numa espécie de jogo da velha.

“Dona Maria Tereza” (canção, 1961) – Juca Chaves
Com a mudança de poder na presidência do Brasil, Juca Chaves ajustou sua mira para João Goulart, conhecido como Jango, na letra da canção “Dona Maria Tereza”, de 1961, em que ele se vale da figura da esposa do presidente para reclamar sobre a situação social do Brasil, com uma vida de tristeza e a fome “de amargar”. Outros personagens da política nacional são citados, como o deputado Carlos Lacerda e o jornal O Globo, para quem, segundo Juca, tudo era “culpa de comunista”. O fato de essas canções políticas de Juca manterem a atualidade política parecem ter mais a ver com a incapacidade do país de avançar do que com o senso atemporal do compositor. A música também só veio a público em 1962, no famoso LP “As Músicas Proibidas de Juca Chaves”.

“Pequena Marcha para um Grande Amor” (marcha-rancho, 1962) – Juca Chaves
Em 1962, Juca Chaves lançou, pela Odeon, um compacto no qual trazia as músicas “Dona Maria Tereza”, “Um Sonho a Mais”, “Pena Preta de Urubu” e a marcha-rancho “Pequena Marcha para um Grande Amor”. Na capa, um desenho do compositor mimetizava sua sombra, enquanto ele carregava o violão nas costas, com botas que lembravam as de um duende. Era a imagem de seresteiro que o compositor assumia nesse lançamento. “Pequena Marcha para um Grande Amor” chamou atenção de uma das maiores cantoras brasileiras de todos os tempos, na ocasião já em final de carreira. Embora vivendo o declínio da trajetória artística, Dalva de Oliveira ainda conservava a exuberância da voz quando, em 1970, deu sua versão para a música de Juca…

“A Cúmplice” (modinha, 1974) – Juca Chaves
Juca Chaves retornou ao Brasil em 1969 e, em breve, com pouco espaço nas gravadoras, lançaria o seu selo independente e lutaria pela numeração dos discos, sem sucesso, batalha que também mobilizaria o cantor Lobão décadas depois. Nesse retorno, procurou virar-se com espetáculos em que misturava música, teatro e poesia. Sem nunca deixar de lado, claro, o humor, sua marca registrada. Em 1974, estreou o espetáculo “Vá Tomar Caju”, e, no mesmo ano, colocou na praça o LP “Ninguém Segura Este Nariz”, sátira com o slogan da ditadura militar, que dizia “Ninguém Segura Este País”. No álbum constava a modinha “A Cúmplice”. Regravada no LP “Juca Bom de Câmera”, de 1977, ela ainda mereceu uma versão do cantor Fábio Jr., acentuando o seu romantismo.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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