“- de onde vinha aquela música?
E era uma nuvem repleta,
entre as estrelas e o vento.” Cecília Meireles
O curso de Direito o aguardava naquele horário, no entanto Emílio tinha feito a opção pela música. Entendedor autodidata do que se designava como teórico era na prática que o sorridente negro de olhar carismático começava a tatear o próprio espaço. Flávio Cavalcanti, àquela altura conhecido apresentador de programas de auditório, o interpelou para subir ao palco. Não titubeou, lancinou a platéia com o melhor da irrequieta alma. O suingue inconfundível de Emílio Santiago dava apenas os primeiros passos.
O cenário carioca onde nascera – na capital do Rio de Janeiro e no ano de 1946, dia 6 e mês 12 do calendário – não demorou a apresentar ao garoto os atrativos a se tornarem inegociáveis na vida adulta. Emílio não abriria mão de apaziguar a fúria dos sons; ninar, durante a insônia, as melodias; e domesticar, cheio de palavras doces; letras e harmonias dos compositores da bossa nova, do samba e das noites de balanços intermináveis. Foi numa dessas peregrinações obstinadas que o destino lhe sorriu em troca.
Embora do dia em que se apresentou na atração do polêmico Flávio Cavalcanti ainda guardasse as lembranças de rostos ilustres, como Maysa e Denner entre os jurados e Lupicínio Rodrigues e Adelino Moreira sendo os autores homenageados, a fama e a glória, tal quais os bolsos das calças, do aspirante a cantor de estandartes, seguiam no aguardo da admiração popular. Não por acaso Ed Lincoln, percebendo o talento à deriva do garoto, o embarcou na nau onde em pouco tempo recebeu os devidos créditos.
Agora como crooner da orquestra do novo padrinho, Emílio aperfeiçoou a ginga e logo se transformou em habituée frequentador das melhores boates de dança da época, ocupando o posto de comandante vocal do espetáculo. Os convites, naturalmente, alcançaram o endereço do artista, que pôde, tendo chegado à janela do vagão, cantar Dick Farney e Gonzaguinha, regravar sucessos do samba, da MPB, e do soul brasileiro, priorizando o ritmo e o romantismo, e como último ato de irretocável trajetória, consagrar o principal incentivador.
Com “Só Danço Samba” apertou fortemente num abraço convicto o “Rei dos Bailes”, Ed Lincoln. Mal transparecia na destituição de pose e na espontânea graça, a realeza de Emílio Santiago, nobre imperador, sem título, a serviço de uma dama intangível, não calculável, irrestrita: chamada “Música”, para outros, “Canção”, mas se a ouvirmos baixinha, suave, com rompantes de fúria grave, numa noite qualquer em que a insônia nos guarde, quem a canta, não haja dúvidas, a niná-la com o macio da alma, só o pode ser Emílio Santiago.
Raphael Vidigal
Lido na rádio Itatiaia por Acir Antão em 24/03/2013.
11 Comentários
Bonito, Raphael. Emílio, sem dúvida, merece as mais altas considerações. Grande cantor e que me influenciou muito para que eu viesse a viver da música. Bananeira eu ouvi com ele a primeira vez quando “tinha eu 14 anos de idade…” Valeu!
Excepcional! Maravilhoso, Emílio Santiago! Que voz! Linda e merecida homenagem, Raphael. Parabéns!
um grande representante da música nacional
Lindas palavras, Raphael! Mais que merecidas para esse grande cantor. Parabéns!
Eu estava esperando Rapha…. Vou ver td, agora!!! bjssss
Deve estar ótimo……. Por Raphael Vidigal!! vamos ver!
muito swing
!!!!!!
parabéns pelo texto e pela homenagem ao Emílio..
seja bem vindo a rede de amigos que curtem e fazem musica e muita arte…prazer
Merecida homenagem, Raphael!
Ouça os maiores sucessos de Emílio Santiago//Corpo e alma