“Deixe então perecer sua esperança; e minha alegria esmorecer no deserto; avance nua.” Virginia Woolf
Dizer que a peça “Pas de Deux para 2 mulheres” é baseada, além de em três textos de Virginia Woolf, na vida da escritora inglesa soa quase como uma redundância. Afinal a artista se entregou ao ofício como à própria vida, que refratava e auxiliava na difícil missão de permanecer, seguir, quando os impulsos de abandonar o mundo eram vários, constantes, diários. Foi em diários, contos, romances e peças entre um modelo e outro, a exemplo da preferência em contestar a exatidão das biografias, que Virginia escreveu um dos capítulos mais marcantes, inquietos e emotivos da moderna literatura. A frouxidão do tempo, do espaço e da condição humana aparece na obra “Orlando”, em que a personagem atravessa séculos e gêneros.
Ao passo em que “Mrs. Dalloway” centra-se na questão da memória, do vazio existencial e das pesadas correntes do passado. Entre uma e outra, um cachorrinho, personagem central de “Flush”, que fará o papel de aproximação e distanciamento entre as duas protagonistas, vividas, na peça, por Andréia Gomes e Luciana Veloso. O desempenho das intérpretes é arrebatador, do começo ao fim, e, por incrível que pareça, cresce à medida que o enredo se desenvolve, deixando no espectador a sensação de extensa proximidade com aquelas vidas, a ponto de não querer que elas se dissolvam ao cerrar das cortinas, aqui invisíveis, como tantas coisas que só se percebem no espetáculo, a partir da magia improvável do bom teatro.
A única indiscrição é a presença da narrativa, em off, na voz sem a expressividade necessária de Cristiano Cunha. O cenário comunica através de sinais, movimentos, pausas, e exala beleza, angústia, medo, assim como a iluminação, trilha sonora e os figurinos. A entrega e a compreensão da loucura, da pureza e da sordidez em cada gesto, cada tecla do piano e folha de repolho, cada flexão de membro entre a dança e a frase certeira e pontual dos belíssimos textos de Woolf contribuem para a comoção. Tem-se, no momento em que se está assistindo a peça, e ainda mais ao seu encerramento, a nítida noção de se ter presenciado a um evento histórico. “Pas de Deux para 2 mulheres” já está marcada, na história da nossa dramaturgia, como obra-prima.
Raphael Vidigal
Fotos: Vitor Moreira
7 Comentários
Oi, Raphael! Obrigado pela crítica. Já postamos em nossa página. Um abraço
Oi Raphael, desde já, agradecemos pelas suas impressões. Vamos divulgar a crítica e o site Esquina Musical.
Abraços
Incrível, provocante e sensível. 🙂
Oi Raphael!!
Obrigada pelas palavras.. Eu vou divulgar sim, com certeza!
Fiquei muito feliz com a sua impressão!! Beijo, obrigada!
Oi, Rapahel! Fico feliz em ler sua crítica. Que bom que vc gostou do espetáculo! Abraços
Muito legal
Fico feliz em saber que gostou…
Primeira vez que componho pra uma peça de teatro…
Foi muito bom de fazer.
Pena não poder assistir.
Obrigada Vidigal! Fiquei feliz demais com sua analise e recepção da peça. Dá um gás na moral da gente! valeu! Vou divulgar sim
abração!