“Os homens constroem também de acordo com as leis da beleza.” Karl Marx
O homem qualquer caminha entre dois muros. Num deles, a poça d’água convida ao mergulho. Porém é ateu. No outro, o cimento une-se ao tijolo dando-lhe o aspecto de barro. Então crê em Deus, vê a costela de Adão a transmutar Eva. Enxerga. O milagre nas reluzentes vestes (desaba o concreto), engenhosas.
Mas os muros a que se ergueram põe na cabeça do homem uma dúvida. Por sobre eles diversos outros, engalfinhando-se, disputam, desarmônicos. Falta-lhes música, notas, acordes. Escuta a Sinfonia de Mozart. Talvez a Fuga de Bach. Urros do comunismo em Marx agarram-lhe a partir das entranhas e estouram os tímpanos.
Solitário em convicções arraigadas, o homem qualquer pretende ao unânime, magnânimo, totalitário das curvas. Instaura uma ditadura. Premente do desafogo, do remelexo, do espaço. Suspiram as algas, suntuosas e largas, aparecendo dos mares como se Zeus lançasse raios. E não há lógica capaz de detê-las. A Beleza é irreversível.
Pois suspendem-se no universo curvo de Einstein, nas pernas fartas das brasileiras e indígenas de colares. Algo nativo, peregrino, mundano, transcendente, notável. Igrejas perdem o formato de antes, palácios reverberam modernidade, o chão abre-se, e um menino miserável, mirrado, faminto, pede uma pequena parte daquele clarão magnífico.
O homem qualquer, mesmo tossindo, cansado, doente, exausto, sopra uma fumaça. Em seguida, aconselha a anônimo próximo o cumprimento de antiga norma. Este traze-lhe um regador, despejando no ar fértil chuva. Ao que avança na direção da criança pedinte, uma irregular nuvem, ora curva, outrora lilás, combinando trajetos e cores, trejeitos e nomes.
O menino, de olhos apagados, não sente nada, dispensa a nuvem, dizendo: “Tenho fome”. O homem velho, qualquer, abonado, responde: “Eu também tenho. E me alimento, de gastos sonhos”. Não enchem barriga, ofende a prole, que vai aumentando, apenas cresce, engole o homem. Chama-se tempo. E o qualquer, é Niemeyer. Nem arquiteto, como disseram. Mesmo escultor, arrisca o gênio.
Somente um homem. Entre dois muros. Empena hastes, pilares, traços.
Raphael Vidigal
8 Comentários
Pois suspendem-se no universo Curvo de Einsten, nas pernas fartas das brasileiras indígenas de colares.Algo nativo, peregrino mudano
“A vida pode mudar a arquitetura. No dia em que o mundo for mais justo, ela será mais simples”
Bj Rapha!
Linda sua homenagem ao genial Niemeyer!
Parabéns! Bjos, Raphael.
Um genio né Raphael Vidigal
Lindo texto!
Total delicadeza Raphael Vidigal. Impressionante!
Show!!