Amy Winehouse foi herdeira da explosiva tríade sexo, drogas e rock’n’roll

*por Raphael Vidigal Aroeira

“Como apanhar o movimento do real, se ao fotografar ou contar congelo o fluxo?” Davi Arrigucci Jr.

Janis Joplin cantava blues. Cássia Eller ia do samba à MPB. Amy Winehouse priorizava o R&B. Não importa. Todas elas eram roqueiras, na acepção da palavra e, tragicamente, investiram tanto na tríade “sexo, drogas e rock’n’roll” que acabaram morrendo em função dela. Há dez anos, as manchetes que perseguiram Amy Winehouse incansavelmente anunciaram o capítulo final de sua curta vida, aos 27 anos, mesma idade que levou Janis, Jimi Hendrix, Jim Morrison e toda uma geração que acreditou no sonho hippie. Uma década antes, havia sido a vez de Cássia Eller, que, aos 39 anos, morreu em circunstâncias ainda hoje controversas, que apontam para uma mistura fatal de erros médicos com os efeitos de uma abstinência provocada pelo tratamento contra o uso de drogas e o estresse em razão do número de shows realizados.

Amy foi herdeira dileta desse estilo que consagrou Janis Joplin, Cássia Eller e a irreverente Angela Ro Ro, que conseguiu escapar da morte na juventude, embora tenha passado muito perto dela, ao se reinventar e conservar o humor ferino a despeito de ter colocado um fim na relação com o álcool. Ro Ro é hoje a sobrevivente desse time, e já declarou ter se enxergado em Cássia e Amy, principalmente quando elas se foram. O que confere a essas cantoras a aura de “roqueiras” – independentemente do gênero escolhido para interpretar –, é a atitude, ingrediente indispensável na combustão que propõe o rock, nascido para contestar a moral dos caretas e desafinar o coro dos contentes. Agregue-se, a isto, o fato de serem dotadas com vozes acima da curva, a serviço da emoção. No palco, fica difícil distinguir a vida da arte no caso dessas cantoras.

O canto de Amy Winehouse ressoava toda a Motown dos anos 1950, com suas vozes negras, melodias negras e os amores desfeitos na gravidade de um contrabaixo. A tinta da mágoa ela carregava com altas doses de suingue dos fundadores do blues na América, agregando elementos contemporâneos sem, contudo, perder o olhar para o passado. Amy não se deslumbrava com inovações nem tinha preocupação em acompanhar a moda. A sua música tinha uma profunda ligação com a história. A história daqueles que provocaram uma revolução nos costumes de sua época e a história enquanto reminiscência de uma relação nostálgica que se tenta agarrar com as mãos, ou, melhor, o canto. Há dez anos, finalmente descansavam as manchetes contra Amy Winehouse. Resta uma voz, com tudo o que quis dizer. “Minhas lágrimas secam sozinhas”.

Artigo originalmente publicado no portal da Rádio Itatiaia, no dia 23 de julho de 2021.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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