10 músicas em homenagem a Marielle Franco: feminista, negra e bissexual

*por Raphael Vidigal

“Garotas com fogo no ventre são obrigadas a beber de um poço de punição até que as chamas se apaguem.” Lesley Nneka Arimah

O chocante assassinato da vereadora Marielle Franco (1979-2018) completou, em 2021, mais de três anos sem ter sido solucionado. Defensora dos direitos humanos, feminista, negra, bissexual e vinda da periferia, a socióloga e ativista tornou-se tema recorrente de canções e manifestações culturais desde a sua morte, transformando-se em um símbolo da luta contra as opressões. MC Carol dedicou música à vereadora, Criolo a citou no videoclipe “Boca de Lobo”, e, em 2019, o samba-enredo da Mangueira trouxe menção a Marielle. A vereadora voltou a ser lembrada nas fortes imagens do videoclipe de “Rumos e Rumores”.

Lançada pelo rapper Vitor Pirralho com participação de Ney Matogrosso, a música apela contra a destruição dos povos indígenas. “Era mais uma mulher pedindo que nos libertassem, que olhassem para o mundo gay e das mulheres negras”, defende Elza Soares. Vocalista e dançarina do grupo Dream Team do Passinho, Lellêzinha também se identifica com a história de vida da vereadora assassinada e faz um apelo: “Não é possível que até hoje não tenham aparecido os mandantes do crime, que já deviam estar na cadeia há muito tempo. Tiraram a vida de uma mulher negra que representava a esperança para várias crianças e adolescentes. Acabam com a nossa vida, e não acontece nada”, protesta ela.

“Marielle Franco” (rap, 2018) – MC Carol
Ícones da nova geração de mulheres empoderadas, representando, cada uma a seu estilo, o reconhecimento em gêneros historicamente fechados a elas no papel de compositoras como o rap e o funk, MC Carol e Karol Conká, negras, faveladas e muito talentosas, uniram forças na música “100% Feminista”, lançado em 2016, cujo título dispensa explicações. Afilhada artística de Tati Quebra-Barraco e amiga de Marielle Franco, MC Carol dedicou uma música à vereadora do PSOL, depois que ela foi assassinada. Em 2018, a convite da deputada Jandira Feghali, MC Carol concorreu a uma cadeira no Congresso pelo PCdoB, com o apoio da União da Juventude Socialista, porém ela não foi eleita.

“Marielle Presente!” (MPB, 2018) – Daniel Fernandes
Zezé Motta, Teresa Cristina, Olivia Hime, Ana Costa e Dorina se unem para saudar Marielle Franco na música “Marielle Presente!”, de autoria de Daniel Fernandes. O título da canção tornou-se uma espécie de hino para lembrar a memória da vereadora assassinada e, de alguma forma, presentificar a sua presença invisível, mas que se faz notar tanto na história de mulheres como Zezé Motta e Teresa Cristina quanto na de milhões de brasileiras que sentem representadas por sua luta pela igualdade. Mulher, negra, oriunda da favela, bissexual e socialista, Marielle tornou-se símbolo da luta por um Brasil fraterno.

“Cidade das Meninas” (rock, 2018) – VINAA
“‘Cidade das Meninas’ é uma canção dedicada à luta pelos direitos humanos e representa o desejo de todas nós morarmos em uma cidade onde predomina a cultura de paz, o respeito às mulheres e às minorias, a igualdade de gêneros e a diversidade sexual. Desejo de Marielle Franco. Desejo de todas nós”. Essas são as palavras de VINAA, artista maranhense que criou a canção e que procuram explicar a inspiração para tal. A interpretação ainda conta com as participações especiais de Camila Boueri, Milla Camões e Tássia Campos, conhecidas como Trio 123. Um grito de revolta e afetividade por todas Marielles.

“O Bicho” (MPB, 2018) – Doralyce
“Essa música está no repertório para que a gente não se esqueça dos nossos heróis e nossas heroínas. Marielle é mais do que uma pessoa, ela é as ideias que tinha, ela é tudo o que construiu, é uma fonte de inspiração para as mulheres pretas. Todas as mulheres pretas olham para ela como olham para Luísa Mahin, para Anastácia, para Dandara. Como uma heroína, como um símbolo de resistência, como uma mulher que lutou contra o racismo. Ela precisa ser lembrada”, introduz a pernambucana Doralyce, antes de entrar nos versos de “O Bicho”, onde ela não economiza na revolta contra a política que matou Marielle.

“História pra Ninar Gente Grande” (samba-enredo, 2019) – Manu da Cuíca, Luiz Carlos Máximo, Deivid Domenico, Tomaz Miranda, Mama, Ronie Oliveira, Marcio Bola e Danilo Firmino
Marina Íris estava ao lado de Marielle Franco (1979-2018) durante a campanha que a elegeu à Câmara Municipal do Rio de Janeiro pelo PSOL, em 2016, com mais de 46 mil votos. Maria Bethânia lançou o álbum “Mangueira: A Menina dos Meus Olhos”, onde regravou o samba-enredo da Mangueira que saiu vencedor em 2019, “História pra Ninar Gente Grande”, que enaltece o legado de Marielle. O citado samba-enredo foi interpretado também por Marina Íris em uma sessão solene na Câmara dos Deputados, em Brasília, em março, um ano após a morte de Marielle. E também entrou como uma das faixas de “Voz Bandeira”, seu terceiro disco, dedicado à vereadora que ajudou a eleger, mas que ficou apenas um ano e dois meses no cargo. Além de Marielle, outras mulheres são exaltadas.

“Quem Mandou Matar Marielle?” (MPB, 2019) – Antônio Nóbrega e Wilson Freire
O pernambucano Antônio Nóbrega estava em frente à TV quando o assassinato da vereadora Marielle Franco foi anunciado, em março de 2018, em crime ainda hoje não elucidado. “Quem Mandou Matar Marielle?”, o questionamento que se tornou um emblema contra a impunidade, aparece em “Rima”, o primeiro álbum de Nóbrega em 12 anos. Parceria com Wilson Freire, a canção indaga: “Com a resistência dos gays, pardos, pretos e índios/ Escreveu a sua história, Brasil/ Pátria que te pariu, pergunta, já à flor da pele/ Quem mandou matar Marielle?”. “Estamos ficando tão acostumados a fatos dessa natureza que a gente, às vezes, releva. Esse acontecimento sempre me indignou de maneira intensa”, diz Nóbrega. “Quando as suspeitas se aproximam da alta cúpula do governo, a impressão é que surgem manobras para postergar o esclarecimento”, completa.

“Marielle Franco” (MPB, 2019) – Jorge Mautner
A morte da vereadora Marielle Franco (1979-2018), em crime que ainda não foi solucionado pela polícia passados mais de dois anos, acendeu em Jorge Mautner uma inspiração em forma de transe. “No dia em que ela foi assassinada, eu, com a emoção estraçalhada em meu coração, compus a letra e a música naquela mesma hora sinistra”, relembra. Batizada com o nome da ativista que se tornou símbolo da luta a favor de minorias, a faixa é a sexta das 14 do álbum “Não Há Abismo em que o Brasil Caiba”, de 2019, e traz os versos: “É preciso arrancar/ Da medula dos ossos/ Dos nervos até a epiderme da pele/ Este medonho cancro/ Que matou Anderson Gomes/ E que matou Marielle Franco”. “Marielle representa a democracia em plenitude, feita com justiça social”, exalta Mautner.

“Não Tá Mais de Graça” (pop, 2019) – Rafael Mike
Em “Não Tá Mais de Graça”, Rafael Mike retoma a história da anfitriã Elza Soares, e rebobina os versos emblemáticos de “A Carne” (2002) a fim de atualizar o sentido daquele protesto. “A carne mais barata do mercado não tá mais de graça/ O que não valia nada agora vale uma tonelada”, dispara, no refrão. A mesma composição menciona Wakanda, lar do super-herói Pantera Negra, e a vereadora Marielle Franco, cujo brutal assassinato ainda não foi solucionado pelas autoridades do Estado. “Estou gritando contra o racismo há muito tempo, demos uma acordada, mas ainda não é suficiente”, reclama Elza.

“Hoje e Sempre” (pop, 2019) – Paco
A bordo de seu ukulele e sob o nome artístico de Paco, o jornalista mineiro Pedro Augusto Correia presta homenagem a Marielle Franco na música “Hoje e Sempre”, disponibilizada em 2019 no Youtube, quando a tragédia completava um ano. Com uma mistura de ritmos que bebe nas influências do reggae e uma textura pop, a canção agrega um time de peso que dá conta de percussão, baixo, guitarra, teclado e vozes de apoio. “Ô, preta!/ Hoje a gente celebra sua vida com o peito apertado/ Com a saudade de quem teve a sorte de estar ao seu lado/ E a certeza: você não morreu, só virou uma ideia”, dizem os versos da música, que ainda cita outros personagens históricos da luta pela democracia e pela igualdade racial, como Dandara, Osvaldo, Zumbi e Marighella. Bela homenagem.

“Sorriso de Marielle” (MPB, 2020) – Etti Paganucci e Gilson Soares
O brutal assassinato da vereadora carioca Marielle Franco gerou comoção no Brasil inteiro, tanto que, em 2020, decorridos dois anos do crime ainda sem resposta, músicos capixabas se uniram para homenageá-la. O encontro resultou em “Sorriso de Marielle”, composição de Etti Paganucci e Gilson Soares que ganhou videoclipe com a presença de vários músicos locais, como Carlos Papel e Raquel Passos. Dizem os versos, adornados com uma cuíca e coro na introdução: “Sorriso de Marielle/ Retrato bom do Brasil/ Luz do olhar/ Brilho na pele/Dignidade civil”. O vídeo já alcança mais de 5 mil visualizações no YouTube.

*Bônus
“Mulheres à Frente da Tropa” (balada, 2020) – Edgard Scandurra

Após um hiato de 13 anos, marcado por brigas e reconciliações, uma das principais bandas do rock nacional voltou à ativa com um disco de estúdio: o Ira!. “Mulheres à Frente da Tropa” é uma das novidades mais emblemáticas do lançamento. Com versos como “Ouçam os gritos das ruas/ Peito à mostra, vozes agudas/ Ouçam as bombas que caem no solo/ Tremem os corpos das crianças de colo”, a música ganhou um videoclipe ambientado na Ocupação 9 de Julho, em São Paulo, lar de 122 famílias há três anos. A presença feminina define a tradução audiovisual. A direção de Luciana Sérvulo se une a um coro de mulheres, pinturas com os rostos de Marielle Franco (1979-2018) e Dandara (data indefinida-1694), símbolos de resistência de movimentos negros e feministas, e performances da bailarina Sandra Miyazawa, da líder indígena-guarani Sônia Ara Mirim, de Carmen Silva, do MSTC, e da ativista Preta Ferreira.

Foto: Instituto Marielle Franco/Divulgação.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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