5 funkeiras que fizeram história na música brasileira

*por Raphael Vidigal

“Quem é que tem pudor quando gosta?” Nelson Rodrigues

Filha de uma empregada doméstica e de um comerciante, Viviane Queiroz nasceu em Queimados, município do Rio de Janeiro, antes de assumir o nome artístico de MC Pocahontas e estourar no Brasil com o hit “Mulher do Poder”. A funkeira abreviou a alcunha e, hoje conhecida como Pocah, é uma das cinco participantes finalistas do Big Brother Brasil 21, uma surpresa para muita gente, já que no começo do programa ela era tida como a “planta” que só dormia, além de ter se aliado à “turminha do mal”, composta por Karol Conká, Nego Di, Projota e Lumena, que logo foram despachados da atração pelo voto do público. Bem-relacionada no universo do funk, Pocah é colega de mulheres que fizeram história na música brasileira, em um dos gêneros mais estigmatizados até hoje.

Anitta
Não há como falar de funk e não lembrar de Anitta, ainda que ela tenha estendido o seu leque musical para diversas áreas. O crítico musical Pedro Alexandre Sanches, por exemplo, questiona se “Anitta é defensora da periferia, reaça ou isentona preocupada em agradar todo mundo o tempo inteiro?”. Cobrada a aderir à campanha “Ele Não” contra a candidatura de Jair Bolsonaro, em 2018, Anitta protagonizou uma série de lives políticas com a advogada e comentarista Gabriela Prioli, em 2020. Fenômeno do TikTok com o hit “Eu Nunca, Eu Já”, a funkeira Angel tem em Anitta a sua principal referência.

Em 2019, Anitta e Ludmilla gravaram a música “Onda Diferente” com a participação do rapper americano Snoop Dogg, que pediu para ser incluído na autoria da música. O que não estava acordado era que Anitta também aparecesse como compositora da música de Ludmilla, o que gerou o fim da amizade entra as duas intérpretes. Outra briga foi com Pabllo Vittar, com quem ela gravou o clipe “Sua Cara”, que se tornou o sétimo mais visualizado no YouTube em suas primeiras 24 horas, com 17,8 milhões de cliques.

Além das fronteiras, Anitta também cantou com Maluma e Cardi B. “Anitta ela planeja com maestria cada um de seus passos, no que se assemelha muito à Madonna. Esperta e inteligente, pega o som que vem do underground e transforma em mainstream, tudo isso associado a uma imagem forte para cada videoclipe”, opina o DJ Zé Pedro. Entre os clipes mais bombados da artista estão “Vai Malandra” e “Bang”, com mais de 400 milhões de cliques, e “Loka”, de Simone & Simaria, em que ela participa, com quase 700 milhões de visualizações no Youtube. Ao todo, Anitta contabiliza quatro discos e 31 vídeos.

Valesca Popozuda
“A liberdade feminina sempre existiu, só que era medrosa. Eu quis libertar as mulheres. Por que não falar do nosso órgão genital?”, questiona Valesca Popozuda, intérprete de “Quero Te Dar”. Valesca Popozuda é uma das personagens mais polêmicas da nova cena cultural no Brasil. Com seu discurso proativo em favor do prazer feminino, é capaz de causar discórdia tanto na ala das feministas quanto na dos machistas, o que lembra a trajetória, em parte, de Leila Diniz (1945-1972), também incompreendida em seu tempo.

O certo é que Valesca não esconde seus sentimentos e, muito menos, suas vontades, sejam elas quais forem. Emblema maior desta atitude libertária, a música “Tá Pra Nascer Homem que Vai Mandar em Mim” é um funk lançado em 2014, de autoria de Wallace Vianna, André Vieira e Leandro Pardal e que deixa claro que, nesse caso, é a mulher quem escolhe, seja a cama, o sexo, ou a atividade no mercado de trabalho. No videoclipe de “Eu Sou a Diva Que Você Quer Copiar”, Valesca Popozuda surge em uma oficina de carro pedindo ajuda e observa os mecânicos babarem sobre seu corpo.

O universo é outro na regravação de Cida Moreira, que levou ao funk de Pardal, Wallace Viana e André Vieira uma atmosfera de cabaré. A versão de Cida foi concebida para “Um Copo de Veneno”, programa de televisão dirigido pelo fotógrafo Murilo Alvesso para o Canal Brasil. A abordagem das duas intérpretes não poderia ser mais distinta, e é isso o que torna a experiência rica. “É uma música muito engraçada, sempre transgredi as minhas próprias regras”, declarou Cida, que garantiu ter recebido um telefonema elogioso de Valesca.

Tati Quebra-Barraco
Na linha evolutiva da música sexual brasileira, é possível dizer que, entre Rita Lee e Karol Conka, o funk de Tati Quebra-Barraco, Deize Tigrona e Valesca Popozuda se impôs como ponto nevrálgico. No começo dos anos 2000, Tati foi a responsável por entoar os versos “se eles quer que você mame/ manda eles te chupar”, invertendo a lógica estabelecida pelo universo machista. Pioneira do funk, nascida e criada na favela Cidade de Deus, ela ficou conhecida pelo estilo impositivo e afrontoso, que aparece em seus maiores sucessos, como “Boladona”, “Desce Glamurosa”, “Sou Feia Mas Tô Na Moda” e “Dako É Bom”, entre outros. Em 2010, ela se candidatou a deputada federal, mas não se elegeu.

MC Carol
Ícones da nova geração de mulheres empoderadas, representando, cada uma a seu estilo, o reconhecimento em gêneros historicamente fechados a elas no papel de compositoras como o rap e o funk, MC Carol e Karol Conká, negras, faveladas e muito talentosas, uniram forças na música “100% Feminista”, lançado em 2016, cujo título dispensa explicações. A letra traz um pungente relato sobre as violências cotidianas às quais as mulheres são submetidas, em um país que naturaliza crimes como o estupro sob a alegação calhorda de que a vítima provocou a reação masculina: “Presenciei tudo isso dentro da minha família/ Mulher com olho roxo, espancada todo dia”.

Afilhada artística de Tati Quebra-Barraco, MC Carol causou rebuliço com outra música de temática feminista, que trazia o emblemático e provocativo verso: “Meu namorado é mó otário/ Ele lava minhas calcinha”. Amiga de Marielle Franco, MC Carol dedicou uma música à vereadora do PSOL, depois que ela foi assassinada. Em 2018, a convite da deputada Jandira Feghali, MC Carol concorreu a uma cadeira no Congresso pelo PCdoB, com o apoio da União da Juventude Socialista, mas acabou não se elegendo.

Jojo Todynho
Estouro no pré-Carnaval de 2018 com “Que Tiro Foi Esse”, que chegou a liderar o ranking de músicas brasileiras viralizadas no Spotify, Jojo Todynho garante estar preparada para não se deslumbrar com o êxito repentino, obtido de forma despretensiosa com o mesmo mecanismo: as redes sociais. “Já fui camelô, trabalhei em shopping num playground, vendi picolé, fui cuidadora de idosos, faxineira. Vejo a vida de uma outra forma e sigo com os meus pés no chão”, afiança. Jojo constata que o ritmo veloz não é privilégio da música.

“Tá tudo acelerado hoje, meu amor. As contas, a vida, os relacionamentos, o sucesso, tudo por causa do progresso e do avanço tecnológico. A gente fala ao vivo com qualquer pessoa do mundo pelo celular. Mas esse avanço tem um preço. Tem pai deixando de dar atenção ao filho, marido (deixando de dar atenção) à esposa, amigos, as pessoas se distanciando umas das outras. Tem que ficar de olho para não deixar o tempo ao lado de quem amamos escorregar por entre os dedos”, alerta a cantora. Em 2020, ela venceu o reality “A Fazenda”.

Foto: Site oficial/Divulgação.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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