“A libertinagem é contraditória: busca simultaneamente a destruição e a ressurreição do outro. Como castigo, o parceiro não ressuscita como corpo e sim como sombra. Tudo o que vê e toca o libertino perde realidade. Sua realidade depende da de sua vítima: só ela é real e ela é só um grito, um gesto que se dissipa. O libertino converte em fantasma tudo o que toca e ele próprio se torna sombra entre sombras.” Octavio Paz
A explosão e a intensidade que poderia se esperar do espetáculo “Sombras: Toda Vaca Tem Nome Próprio”, fica no título. À parte a entrega sincera do trio de atores, Raquel Dutra, Raquel Lauar e Rodrigo Mangah não escapam à superficialidade. As personagens emergem rasas de um cenário vívido e bem cuidado, mas que, assim como a discreta iluminação, não é capaz de superar o texto recheado de clichês e a direção idem, ao optar pelo didatismo.
Com a cena montada à essa maneira torna-se impossível não soar melodramático, piegas, com um roteiro que falha tanto na tentativa de emocionar quanto na de parecer inventivo, novo. A autoria da peça pertence ao dramaturgo argentino contemporâneo Héctor Oliboni e chega pela primeira vez ao Brasil.
O lugar em que é colocado o artista, como “um estranho”; o enfraquece. A forma como a presença masculina é levada, ainda “a intolerância, a violência, a intimidação” e as alusões à “morte”; não impactam como crítica. Permanece no papel do carrasco enquanto às mulheres basta serem vítimas. Falta complexidade.
Desta maneira temos uma visão reducionista que pouco ou nada contribuirá para as questões que os envolvidos no espetáculo, provavelmente, pretendem tocar, ou até interferir com uma parcela de mudança na nossa sociedade que ainda é refém de muitos daqueles comportamentos. Mas sem um drama de peso, uma abordagem precisa e mais incisiva, eles continuarão banais. E nós, no mesmo lugar. Não mais atônitos, mas acostumados.
Raphael Vidigal
Fotos: Divulgação.