Show: Renato Teixeira & Banda

“a coisa não está nem na partida e nem na chegada. Está é na travessia.” Guimarães Rosa

Romaria

O irredutível carisma de Renato Teixeira segue tocando a boiada. Como legítimo mártir da música caipira, o homem da barba branca, dos cabelos brancos, põe a viola dentro da sacola e vai viajar. Convida-nos a ir com ele: seus filhos (nascidos e criados) de uma sincera amizade.

Por entre estradas de ferro e terra, trilhos de trens e cores, referências a Caetano Veloso e Sérgio Reis, soa o berrante do segundo e a São Paulo do primeiro: duas musas inspiradoras do franzino homem do interior que “anda devagar porque já teve pressa, e leva esse sorriso porque já sofreu demais”, entoa junto com o coro da plateia o sucesso bisado por Almir Sater.

Enquanto desloca-se no tempo com inegável flexibilidade, Renato mantém a firmeza do caráter e a malemolência do humor necessário para se enfrentar o cotidiano. A repetição de paisagens, paixões, luares, é modificada pelo saber determinado e fluido daquele que desbravou (e ainda desbrava) preconceitos vários. Mazzaropi acena com chapéu de palha e cigarro aceso dentro duma tela.

Do sucesso popular da dupla “Vitor & Léo” a citação do há tempos clássico Guimarães Rosa, numa demonstração de desapego a etiquetas e definições primárias, o pequeno sujeito em cena transcende a grandeza aparente e alcança a intangível. Ainda que as interpretações não cheguem ao largo da emoção possível, o prazer de estar vendo o mito desfaz qualquer brevidade, entretanto, porém.

O canto do nobre violeiro é eterno: suas causas, seus quebrantos, a mandinga a amantar o povo, o folclore, o pescador, a garça na beira da lagoa. As lendas a entremear as Minas e cair no copo do boêmio Vanzolini, também chamado Paulo, em sua cadeira, num consultório chique do cientista, zoólogo. Uma sessão de divã para os brasileiros: “Ronda”, “Volta por cima”, “Cuitelinho” com improvisado incremento.

Renato Teixeira é de uma simplicidade tão clandestina que se torna difícil defini-lo. Talvez somente um pai ensinando ao filho os saberes aprendidos. Para isso a música, os versos, a navalha que corta a viola, o aço duro do planeta, e as cordas finíssimas, frágeis, o sentimento de cada ser: bicho, animal, planta. Fazenda, curupira, roça. Caipira porá.

Tocando em frente

Raphael Vidigal

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11 Comentários

  • Adorei!!!!!

    Apesar da intangível emoção pela voz, Renato Teixeira tem seu lugar como “messias” do grande sertão veredas.

    E outra… perfeito esse final!

    “Renato Teixeira é de uma simplicidade tão clandestina que se torna difícil defini-lo. Talvez somente um pai ensinando ao filho os saberes aprendidos. Para isso a música, os versos, a navalha que corta a viola, o aço duro do planeta, e as cordas finíssimas, frágeis, o sentimento de cada ser: bicho, animal, planta. Fazenda, curupira, roça. Caipira porá.”

    Resposta
  • Ahhhhhhhhhhhh!!!!!!!!!!!!!!!!! Um dia ainda quero ir num show dele! Deve ser legal demais!

    Resposta

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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