6 marchinhas (quase) mineiras para o Carnaval

“Exaltação – Império Sentido na Avenida – Carnaval da síncope. Pratos limpos atirados para o ar. Circo instantâneo, pano rápido mas exato descendo sobre a sua cabeleira de um só golpe de carícia, e o teu espanto!” Ana Cristina Cesar

marchinha sobre temer e silvio santos

Nos últimos anos, além dos bares, BH tornou-se também a capital do Carnaval. Com uma programação ampla e diversificada a cidade passou a receber os tão tradicionais e antigos blocos carnavalescos que, fora remeter à memória, trouxeram suas próprias inovações com misturas inusitadas e, acima de tudo, festeiras. Vale fantasia, vale confete e serpentina, principalmente, vale alegria! Com esse intento selecionamos 6 marchinhas mineiras para você pular durante os 4 dias de farra e folia, cada uma delas distintas entre si, para privilegiar, como marca do carnaval de Belo Horizonte, justamente a diversidade. São elas uma marcha-rancho, uma marchinha entre o romance e a ironia, uma marcha em homenagem ao Carnaval e três marchinhas políticas, ambas com aquela já habitual pegada de humor. Vamos à festa foliar!

Santo Profano, Deusa Mulher (marcha, 2018) – Raphael Vidigal
Não sou diário/ Nem sou diurno/ Nem sou sonâmbulo/ Porém não durmo
É que ao contrário/ De ser profundo/ Eu entro raso/ No absurdo
Santo profano/ Deusa mulher/ Vivo a chorar/ Morro de rir
Visto confetes/ E serpentinas/ Eu sou apenas/ A sua fantasia

Eu canto só/ Na multidão/ Com Pierrô/ E Arlequim
Já fui Rei Momo/ E Colombina/ Na quarta-feira
Você varre minhas cinzas
Santo profano/ Deusa mulher/ Vivo a chorar/ Morro de rir
Visto confetes/ E serpentinas/ Eu sou apenas/ A sua fantasia

Eu canto só/ Na multidão/ Com Pierrô/ E Arlequim
Já fui Rei Momo/ E Colombina/ Na quarta-feira
Você varre minhas cinzas

É que ao contrário/ De ser profundo/ Eu entro raso
No absurdo/ Visto confetes/ E serpentinas
Eu sou apenas/ A sua fantasia/ Já fui Rei Momo
E Colombina/ Na quarta-feira/ Você varre minhas cinzas

Adeus de Carnaval (marcha-rancho, 1967) – Maria Inês Aroeira Braga
A história de “Adeus de Carnaval” é curiosa, só para adjetivar. Pois, na verdade, é muito mais. Composta no fim da década de 1960 por Maria Inês Aroeira Braga, poeta, mística e artista plástica mineira, a música retornou à tona anos depois, em 2014 quando, por iniciativa de seu irmão, Marcelo Aroeira, ela foi gravada em estúdio pelo cantor Mauro Zockratto. Mas seu percurso ainda não tinha terminado. Três anos depois, em 2017, inscrita no “Concurso de Marchinhas Mestre Jonas” foi selecionada entre as finalistas para ser apresentada num show. Feita esta parábola, vamos à sua história, que remonta a todas as tradições carnavalescas, começando por seu ritmo, a marcha-rancho, alusão aos antigos ranchos que desfilavam nas ruas antes das escolas de samba e, claro, aos amores desfeitos que, desde Colombina, Arlequim e Pierrô enfeitam e colorem os carnavais brasileiros. Viva nossa festa!

Morrendo de Rir (marchinha, 1972) – Ronaldo Ferreira, Zé Lírio e Galileu
Trio paulista natural de Marília, no interior do estado, Ronaldo Ferreira, Zé Lírio e Galileu acumulam histórias pra contar junto a nomes importantes da música popular brasileira. Uma delas diz do encontro de Ferreira com a trupe dos Novos Baianos, quando estes se hospedaram no sítio de seu avô que, por acaso, tinha um abacateiro logo na entrada. Não é por acaso que se conta que também Gilberto Gil passou por lá, o autor dos versos “abacateiro acataremos teu ato, nós também somos do mato como o pato e o leão”. Gil que se referia a Zé Lírio como o “poeta de Brasília”, por tê-lo conhecido naquelas bandas. Já sobre Galileu se sabe pouco, além do inspirado nome no famoso astrólogo, que também serviu de fonte para outra obra louvável, a peça do dramaturgo alemão Bertolt Brecht. “Morrendo de Rir”, em suma, convida à folia com alegria!

Do Isopor ao Viaduto (marchinha, 2016) – Raphael Vidigal, André Figueiredo e Ronaldo Ferreira
Dizem que o Brasil é o “país da piada pronta”, verso repetido à exaustão pelo colunista José Simão, mas há sempre gente querendo reinventá-la, especialmente na política. Márcio Lacerda, prefeito de Belo Horizonte durante oito anos ficou conhecido por suas patacoadas entre os dois mandatos. Eleito por via de uma inédita aliança entre PT e PSDB, a união entre petistas e tucanos em torno de seu nome não deu lá grandes resultados após a apuração das urnas. Entre suas declarações mais célebres afirmou que “não era babá” dos habitantes de Belo Horizonte quando um casal de idosos morreu afogado durante uma enchente na capital. Por fim, resolveu proibir a utilização de isopor e churrasqueira nas ruas no período das comemorações carnavalescas, pouco tempo depois de um viaduto desabar em BH durante a “Copa do Mundo 2014”.

Cuidado com o pescoço (marchinha, 2017) – Raphael Vidigal, André Figueiredo e Ronaldo Ferreira
Composta em 2017 a marchinha “Cuidado com o pescoço” mistura duas das receitas mais tradicionais na música brasileira para chegar à sua fórmula festiva. Começando pelo recorte histórico tece ilações entre figuras que foram acusadas de traição com o homenageado que inspira o título. Recurso bastante utilizado nos sambas-enredos. Por outro lado, remete à antiga mania de escárnio presente desde os tempos do poeta satírico Gregório de Matos, conhecido como “Boca do Inferno” e representado em filme pelo também poeta Wally Salomão. A homenagem às “grandes figuras” políticas vem desde o tempo em que Getúlio Vargas ficava irritado ao ser chamado de velho na marcha que trazia o refrão “bota o retrato do velho outra vez, bota no mesmo lugar, o retrato do velhinho faz a gente trabalhar…”. Ora só, o aviso está dado!

Retiro do Vampiro (marchinha, 2018) – Raphael Vidigal e Ronaldo Ferreira
A cada dia aumenta a resistência/ Então vamos reformar a Previdência
Para quem acredita em vampiro/ A eternidade pode ser um bom retiro
Então vamos à labuta/ O dinheiro pro meu bolso
Eu chamo sua mãe de santa/ O povo é quem paga a conta

E pra não deixar por pouco/ O trabalho foi escravo
Mas te dei casa e comida/ Em 140 anos de vida
Agora nosso calendário é Maia/ Quem não é rato serve de cobaia
Pra ter apoio tem capital de giro/ E ninguém bate panela pra vampiro

Então vamos à labuta/ O dinheiro pro meu bolso
Eu chamo sua mãe de santa/ O povo é quem paga a conta

carnaval de rua em bh

Raphael Vidigal

Imagens: Charge de Renato Aroeira; e foto de Lucas Hallel/Divulgação, respectivamente.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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