Sambista e pintor, Heitor dos Prazeres representou o Brasil em festival

*por Raphael Vidigal Aroeira

“tudo o que é amor suave e sentimento
e pejo pintarei de rosa e negro:” Jorge de Lima

Heitor dos Prazeres nasceu no Rio de Janeiro, no dia 23 de setembro de 1898, e morreu na mesma cidade, no dia 4 de outubro de 1966, aos 68 anos. O pai era marceneiro e tocava na banda da Polícia Militar, atividades que Heitor também seguiu, depois de iniciar a carreira como polidor de móveis. Estudou apenas até a quarta série do primário e, mesmo trabalhando desde os sete anos de idade, ficou preso por dois meses, acusado de vadiagem, quando tinha treze anos.

Passou a adolescência entre a Praça Onze e o Mangue, convivendo com chorões e bambas do samba. Bom de “pernada”, Heitor dos Prazeres passou a ser respeitado nas rodas de samba, e contribuiu para o surgimento de diversas escolas carnavalescas, como Mangueira, Portela e a pioneira Deixa Falar. Antes de completar dez anos, já tocava cavaquinho e, em 1929, venceu um concurso de samba patrocinado pelo jornal A Vanguarda, com “A Tristeza Me Persegue”, gravado com grande êxito pela Velha Guarda da Portela na década de 1970.

Treta. A rivalidade com Sinhô rendeu grandes clássicos da música brasileira. Heitor acusava o parceiro de não creditá-lo em sambas que ele teria ajudado a compor, como “Ora Vejam Só”, rebatizada para “Gosto Que Me Enrosco” na gravação de Mário Reis, e “Cassino Maxixe”, pela qual Heitor ganha o direito de receber trinta e oito mil réis após ação na Justiça. Em “Deixaste o Meu Lar”, composto só por Heitor dos Prazeres, consta o nome de Francisco Alves como autor, comprovando o comércio de sambas pelos compositores pobres aos ricos cantores do rádio na década de 1930.

Repertório. Com Cartola, compôs “Consideração”, gravada por Beth Carvalho. “Canção do Jornaleiro”, outro êxito, fez sucesso com Wanderley Cardoso. Já “Noite Enluarada” ganhou a voz de Pery Ribeiro, filho de Dalva de Oliveira e Herivelto Martins, parceiro no samba. “Sou Eu Que Dou as Ordens” foi lançada por Aracy de Almeida e regravada pela sempre atenta Cristina Buarque. A nova geração também se voltou para Heitor dos Prazeres. Pedro Miranda, Julieta Brandão e Juliana Amaral regravaram pérolas pouco conhecidas de sua obra.

Pintura. Heitor também compôs, com Nelson Gonçalves, “Até Que Enfim Favela”, em 1945. Nesse período, ele já se dedicava à pintura primitivista, que o levou a participar da Primeira Bienal de São Paulo, em 1951, onde retornou em 1953 e 1961. Com a carreira de pintor deslanchando, ele participou de mostras coletivas na América Latina, da exposição “Oito Pintores Ingênuos Brasileiros”, na França, “Pintores Primitivos Brasileiros”, em Moscou, dentre outras. No ano em que morreu, representou o Brasil no Festival de Arte Negra, em Dacar, no Senegal.

“Lá em Mangueira” (samba, 1943) – Herivelto Martins e Heitor dos Prazeres
A união de bambas da tarimba de Herivelto Martins e Heitor dos Prazeres não poderia resultar em outra coisa: um clássico da música brasileira. Foi o que os dois criaram com “Lá em Mangueira”, samba lançado em 1943 para saudar a Estação Primeira. A primeira gravação da música foi feita pelo Trio de Ouro, integrado pelo próprio Herivelto, Dalva de Oliveira e Nilo Chagas. Posteriormente, Heitor dos Prazeres foi outro intérprete da canção, que ainda ganhou registros de Zeca Pagodinho, Martinho da Vila e Os Originais do Samba. “Lá em Mangueira/ É que o samba tem seu lugar”, afirmam os versos.

“Pierrô Apaixonado” (marcha, 1936) – Heitor dos Prazeres e Noel Rosa
O maior êxito da carreira de Heitor dos Prazeres veio em 1936, quando, ao lado de Noel Rosa, compôs a marcha “Pierrô Apaixonado”, sucesso carnavalesco que atravessou gerações. Lançada pela dupla formada por Joel & Gaúcho, com acompanhamento da orquestra Diabos do Céu e arranjo de Pixinguinha, a música foi incluída no filme “Alô, Alô, Carnaval”, com Carmen Miranda e Oscarito no elenco. Maria Bethânia, Ivan Lins, Teresa Cristina e Gabi Milino também regravaram esse clássico.

Quando Noel escreveu a letra, menos de um ano antes de falecer vítima de tuberculose, aos 26 anos, a doença não o impediu de manter o humor, que se pode notar nos divertidos versos, que mesclam sentimentalismo com gaiatice: “Um grande amor tem sempre um triste fim/ Com o Pierrô aconteceu assim/ Levando este grande chute/ Foi tomar vermute/ Com amendoim…”. Ao fim, uma Colombina altiva e ébria manda os pretendentes às favas e sugere que eles tomem sorvete juntos.

Matéria publicada originalmente no portal da Rádio Itatiaia, em 2021.

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Raphael Vidigal

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, atua como jornalista, letrista e escritor

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