Movimento do cinema nacional teve Nelson Rodrigues como referência
Nelson Rodrigues foi um dos preferidos, se não o escolhido, para ter suas obras passadas ao olho do “buraco da porta” da pornochanchada. O auto-apelido do dramaturgo, “anjo pornográfico”, era a cara descarada do gênero surgido na década de 70 para resgatar um jeito simples de contar histórias e atrair o público, combinando pornografia baratinha, quase inocente, sem os escândalos boateiros de sexo explícito, com muito deboche, comédia irônica e violenta. Algum autor mais indicado do que o jornalista dos contos da “Vida como ela é”? Difícil imaginar, afinal todos os personagens da pornochanchada podiam ser vistos como a dama do lotação, a prostituta Geni ou os malandros interessados em estupros de qualquer tipo.
Encenada muitas vezes na freqüentada “boca do lixo” de São Paulo, claro, por personagens reais e fictícios, a obra pornochanchadeira, que tinha o complemento do gênero que mais fez sucesso popular com o público brasileiro por discorrer na tela características da comédia de costumes, tornou-se mal falada e pouco assumida inclusive por aqueles que participaram dela. Em especial as atrizes que não queriam ser vistas como específicas daquele cinema “barato, baixo, feito para a camada popular.” Coube a Arnaldo Jabor, Nelson Rodrigues, mesmo Sônia Braga e Paulo César Peréio assumirem o “filho que era teu”. E por direito.
O Filme: Toda Nudez Será Castigada
O ridículo da história é que dá o tom da comédia autêntica. Paulo Porto como um viúvo chorão e puritano aparece impagável, enquanto Darlene Glória encarna a prostituta que havia em sua essencial sensibilidade artística antes de se tornar evangélica. “Toda nudez será castigada” é seminal parceria da transição das obras de Nelson Rodrigues para as telas do cinema através do olho do cineasta/jornalista político Arnaldo Jabor. A história transcorre em clima de violência por todas as partes, sexo em quartos de bordel e muita comédia escrachada, protagonizadas principalmente pelo irmão cafajeste do viúvo Herculano, vivido por Paulo César Peréio, praticamente o próprio. O romance na cadeia e o suicídio exasperado de Darlene Glória, que registra tudo em uma fita cassete para narrar a trama são imagens perpetuadoras da obra.
O Ícone: Paulo César Peréio
Paulo César Peréio é a imagem da cafajestalha. A imagem de uma leseira desbundada. Mas sempre foi, sobretudo, o deboche em pessoa. A figura do ator se confunde com seus personagens porque o gaúcho de Alegrete faz questão de impor o tempo todo uma postura provocativa frente às pessoas. Peréio está sempre testando seu limite e seu bom senso. É a rebeldia sem ligação movimentista ou bandeiras descolores. É a rebeldia sempre incômoda, arrogante, incompreensiva para olhos sem substância líquida do teatro despojado que ele levou para as telas de cinema em suas interpretações pitorescas e deliciosas. Peréio é o cafajeste pelo qual não queremos ter carinho. E é esse seu grande mérito.
Raphael Vidigal
Produzido para o blog Brasil na Cena, matéria de Cinema ministrada na PUC Minas por Robertson Mayrink.
9 Comentários
Gostei muito viu amigo Raphael Vidigal!Bjs.
Obrigado, Martha Mary!
Valeu Raphael, quando acabar de ler, te falo o que achei.
Ok, Leandro. Abraços
As histórias do “Anjo Pornográfico” são todas imperdíveis. A Esquina Musical está de parabésn pela escolha do tema. Nesse gênero, não conheço nada melhor do que o talento do nosso Nelson Rodrigues. Muito obrigada Raphael Vidigal!!
Eu que lhe agradeço pelos comentários e presença, Ana Cláudia! Volte sempre! Abraços
Eu não sabia que Arnaldo Jabour teve participação nisso, pelo menos um dia ele já participou de alguma coisa interessante ahahahah. No youtube tem vídeos completos desses filmes? Só achei trechos e curtas.
Tava reparando aqui. Os cartazes da época eram muito bons, né?
Obrigado pelos comentários, Leandro. Tem toda razão, José. Abraços