*por Raphael Vidigal Aroeira
“Quando chegou carta, abri
Quando ouvi Prince, dancei
Quando o olho brilhou, entendi
Quando criei asas, voei…” Chico César
O paraibano Chico César nasceu em Catolé do Rocha, no sertão do Estado, no dia 26 de janeiro de 1964. Aos dezesseis anos, mudou-se para a capital João Pessoa e formou-se em Jornalismo pela Universidade Federal da Paraíba. Mas o destino de Chico César estava na música. Já na universidade, ele entrou para um grupo de poesia de vanguarda. Com 21 anos, decidiu se mudar para São Paulo e correr atrás do sonho. Foi lá que, trabalhando como revisor de textos da Editora Abril, ele juntou recursos para se aprimorar no violão.
“À Primeira Vista” (balada, 1995) – Chico César
Em 1991, Chico César foi convidado para uma turnê na Alemanha. A boa repercussão o animou a investir em seu primeiro disco, “Aos Vivos”, de 1995, que já trazia o megassucesso “À Primeira Vista”, música que seria regravada por Daniela Mercury, já no ano seguinte. Em 1995, a balada também recebeu uma versão da multi-instrumentista Badi Assad. Entre os sucessos de Chico César também se destacam “Mama África”, “Deus Me Proteja de Mim”, “Onde Estará o Meu Amor”, “Estado de Poesia”, e etc.
“Mama África” (MPB, 1995) – Chico César
Chico César conta que estava em um táxi quando a melodia e a letra de “Mama África” simplesmente apareceram em sua cabeça e, sem estar munido de lápis, caneta, ou um gravador, começou a repeti-las insistentemente na cabeça para não esquecer, deixando inclusive de dar atenção à irmã.
A inspiração apareceu quando, de mudança para São Paulo, observou, em um grande mercado, diversas mães que, em meio ao trabalho também tinham que se preocupar em amamentar os filhos, cuidar deles e se atentar para com todas as necessidades da prole. Daí os versos que descrevem essa realidade. No fundo, a música é uma homenagem não só à figura da mãe, mas, acima de tudo, um hino à coragem da mulher brasileira, que, contra todos os preconceitos e percalços traça o seu caminho com determinação e coragem.
“Mand’ela” (MPB, 1996) – Chico César e Zeca Baleiro
De forma bem humorada e espirituosa a dupla de nordestinos Chico César e Zeca Baleiro, o primeiro paraibano e o segundo maranhense, criou em 1996 uma inusitada homenagem para o líder sul-africano Nelson Mandela. Lançada pelo mineiro Maurício Tizumba, em seu álbum de estreia, “África Gerais”, no qual incluiu uma citação à cidade de Sabará, a canção usa e abusa do jogo de palavras para se referir à cultura negra, além de uma impagável brincadeira com o nome do arcebispo da Igreja Anglicana, Desmond Tutu, um dos principais aliados de Nelson Mandela na luta para a implantação da paz e contra o Apartheid, o regime de discriminação racial na África do Sul. “Mand’ela” foi posteriormente gravada por Chico César, um dos seus autores, no álbum “Cuscuz Clã”, no mesmo ano de 1996. E repetiu o êxito.
“Onde Estará O Meu Amor” (balada, 1996) – Chico César
Maria Bethânia voltou à temática circense em 1996, com o disco “Âmbar”, um dos mais bem-sucedidos de sua carreira, que faturou, inclusive, certificado de ouro pelas milhões de cópias vendidas. No repertório, ela revisitava a clássica “Chão de Estrelas”, de Sílvio Caldas e Orestes Barbosa, e dava voz a novidades de Adriana Calcanhotto, Chico César, Carlinhos Brown, Arnaldo Antunes e outros. Dentro dessa seleção luminosa, também constava “Onde Estará O Meu Amor”, uma balada de Chico César, envolvente e íntima como pede a voz da intérprete. Chico gravou a sua versão no ano seguinte, em 1997.
“Paraíba, Meu Amor” (xote, 1997) – Chico César
Para Chico César, são todos iguais e também diferentes. Ele refere-se a Cátia de França, Zé Ramalho, Pedro Osmar, Ivan Santos, Jackson do Pandeiro, Elba Ramalho, Sivuca e Vital Farias, músicos que são seus conterrâneos. “Cada vez mais, curiosamente, é definidor para mim ser um sertanejo da Paraíba. Tudo que olho no mundo é como uma pessoa de lá, me sinto muito ligado a todos esses artistas. A impressão que me dá, na música, é que existe um jeito de estar paraibano, e sem clichê, todos são parte de um lugar com mil olhares”, elabora, e aproveita para citar ídolos vindos de outras paragens nordestinas, como a pernambucana Marinês (1935-2007), e o maranhense Zeca Baleiro, 51, de quem é contemporâneo. Em 1997, Chico César homenageou o seu Estado natal com o malemolente xote “Paraíba, Meu Amor”.
“Respeitem Meus Cabelos, Brancos” (MPB, 2002) – Chico César
Ao se nutrir de “músicas que apontam para a questão negra”, Xenia França trouxe referências ligadas a jazz, música cubana, samba-reggae, rock e candomblé. “Tudo o que vem dessa ancestralidade me atravessou, e eu transmiti essa diáspora com o meu jeito de fazer música”, observa. Xenia ainda ressalta que, na verdade, foi “escolhida pelas canções”. Uma dessas a marcou desde a infância, quando ela ouvia, no rádio, “Respeitem Meus Cabelos, Brancos”, do paraibano Chico César.
“Deus Me Proteja” (MPB, 2008) – Chico César
A cantoria da advogada paraibana Juliette no Big Brother Brasil 21 levou o conterrâneo Chico César ao topo das paradas de sucesso. Tudo porque a participante da atração começou a cantar com frequência “Deus Me Proteja”, uma delicada cantiga de Chico César, lançada originalmente em 2008, no álbum “Francisco, Forró Y Frevo”, em gravação que contou com a participação mais do que especial do sanfoneiro Dominguinhos (1942-2013). Ao fim da faixa, o próprio Dominguinhos elogia com entusiasmo essa música composta por Chico César.
“Felicidade” (balada, 2010) – Chico César e Marcelo Jeneci
Disco de estreia do cantor e compositor paulista Marcelo Jeneci, “Feito Pra Acabar”, de 2010, congrega parcerias do anfitrião com nomes de peso da música brasileira, como Arnaldo Antunes, Luiz Tatit e Zé Miguel Wisnik. No entanto, além da faixa-título, o destaque ficou por conta de “Felicidade”, música escrita com o paraibano Chico César, que condensa, em seus últimos versos, a “fofura” desse trabalho: “Chorar, sorrir também e dançar/ Dançar na chuva quando a chuva vem”. Para ajudar no êxito da empreitada, essa balada cheia de boas energias e mensagens positivas ganhou videoclipe que já acumula 21 milhões de cliques.
“Estado de Poesia” (MPB, 2013) – Chico César
O caminho que o paraibano Chico César fez para criar o novo foi revirar os olhos à origem. Seu hiato de oito anos sem disco de inéditas acabou interrompido em 2015, com o lançamento de “Estado de Poesia”, cujo título é, justamente, o da única canção que já havia sido registrada, em 2013, por Maria Bethânia, no álbum “Carta de Amor”.
“Essa música marca o encontro de dois estados: o do meu interior, subjetivo, com o geopolítico, da minha Paraíba, do Estado feito sensação e, ao mesmo tempo, máquina institucional, opressora, contra a qual a poesia serve como arma para a gente lutar, no sentido de encarar a vida pelo seu viés”, elabora o músico. A música também recebeu uma gravação ao vivo.
“Da Taça” (balada, 2015) – Chico César
“Eu não me refiro, apenas, à poesia romântica, concreta, parnasiana, abstrata. Falo do poema prático que, na verdade do nosso cotidiano, é um elemento poderoso na hora de encarar a realidade autoritária e engessada que querem nos impor, onde tudo que se vende é para lucrar. A poesia me apresenta uma estrada larga, coloca a todos num caminho aberto, onde estamos descobrindo, inventando e incluindo mais gente”, define Chico César, que, em 2015, lançou a balada romântica “Da Taça”, uma das mais comoventes deste seu repertório.
“Caracajus” (MPB, 2015) – Chico César
“A fruta em seus lábios/ a alma saindo pela boca/ os lábios de sua fruta calma/derramando em calda/ a polpa”. Os versos emergem de “Caracajus”, uma das canções do recente trabalho e que César elege como sua predileta. Logo, a inspiração romântica é declarada.
“O nascer desse disco vem do fato de eu ter me apaixonado e casado com a (atriz) Bárbara Santos, o que me deu uma agilidade poética e me fez redescobrir e aceitar que alguns gestos são fios desencapados, não precisam estar resolvidos. A resolução é a possibilidade de faísca e curto-circuito”, filosofa Chico César, ao conservar o amor numa poesia.
“O Amor É Um Ato Revolucionário” (balada, 2019) – Chico César
A experiência acumulada como presidente da Fundação Cultural de João Pessoa e, posteriormente, secretário de Cultura da Paraíba, entre 2009 e 2014, trouxe para Chico César saudades de outro ambiente menos concreto e pedregoso. “Depois de seis anos trabalhando com burocracia, vai se aniquilando a sua espontaneidade e, aos poucos, você começa a acreditar naquele universo”.
“Eu precisava, física e mentalmente, voltar a essa pegada de deixar o fluxo correr. Não como uma corrente de metal, mas um rio corrente. Isso contaminou minha vida em geral, foi para a minha música, e o público percebeu”, comenta o cantor. Como prova dessa tese, ele lançou, em 2019, “O Amor É Um Ato Revolucionário”, em que transforma o afeto numa poderosa arma política. A canção tem tons religiosos que a carregam ao ambiente das preces e louvores.
Matéria publicada originalmente no portal da Rádio Itatiaia, em 2022.