“Certamente não é alegre; há espetáculos mais joviais, leituras mais leves; mas o interesse não está na leveza nem na alegria. A tragédia é terrível, é pavorosa, mas é interessante. Depois, se é verdade que os mortos governam os vivos, também o é que os vivos vivem dos mortos.” Machado de Assis
Quando Cristo reuniu seus apóstolos para celebrar a Santa Ceia disse que seria traído por um deles, de acordo com as escrituras bíblicas. Joaquim José da Silva Xavier, também conhecido como o alferes Tiradentes não tinha a mesma consciência, tampouco o imperador romano Júlio César, apunhalado pelas costas pelo filho adotivo Brutus. De acordo com lógica vigente há quem diga que quem votou em Cristo votou em Judas, e quem votou em Tiradentes também votou em Joaquim Silvério, e assim por diante. Fato é que a história não costuma ser muito simpática a tais personagens, não por acaso malhadas em celebrações até hoje típicas nas cidades. Michel Temer, talvez, tenha calculado mal o peso do tempo, embotado pela fricção momentânea que a estimativa de poder é capaz de causar. Em cima agora, de baixo para sempre.
Independente da posição política ninguém poderá negar que Temer conspirou para derrubar o governo com o qual se elegeu vice-presidente. Esta constatação paira acima das opiniões. É óbvio e notório que sem a adesão em massa do PMDB, coordenada pelos caciques, mas, sobretudo, Eduardo Cunha – que garantiu ao outrora interino o arrebanho da Câmara para impetrar o golpe de Estado, e, assim, estimulou o companheiro ao salto a fim de arrecadar a faixa – não seria possível tal manobra. As razões para o PMDB abandonar o barco são inúmeras, basta analisar o número e os perfis dos que o compõe e sua natureza historicamente fisiológica. Mas a razão específica de Temer é a de ter vislumbrado o ouro frente aos olhos: cobiça, vingança, poder, vaidade? Mais antigo do que os versos bardos de Shakespeare e o reino da Dinamarca.
Certo é que há uma razão específica para que nenhuma mãe depois de Cristo tenha sido capaz de batizar o filho com o nome de Judas. Pesa a alcunha de traidor. Desta triste rima nem o talento poético, nem a mesóclise, poderá salvar Temer do papel a que a história o destina. Não será o bufão, e nem o coro…
Raphael Vidigal
Fotos: Ueslei Marcelino; e Marcelo Camargo, respectivamente.