O coração explosivo fulminou o homem-bomba. A última letra do primeiro nome, embora muda, já prenunciava o início musical do instrumento que ele iria tocar. Hoje ainda se fala no seu bandolim. Assanhado, diabinho maluco, bole-bole, doce de coco. Ainda se ouvem suas vibrações, sua alvorada e a ginga do Mané. “Jacob toca Jacob, os outros tocam bandolim”. Disse Radamés Gnatalli sobre aquele que dominou o choro e não conteve as lágrimas e emoções, despejou tudo nas cordas de um pequeno pedaço de madeira que ele abraçou com coração pronto a explodir em notas e melodias. Discípulo de Ernesto Nazareth e Pixinguinha, Jacob do Bandolim é, segundo o coro de entendedores do gênero como Sérgio Cabral e Henrique Cazes, “o maior instrumentista que o Brasil já teve.” Um mestre.
Noites cariocas (choro, 1957) – Jacob do Bandolim e Hermínio Bello de Carvalho
“Noites cariocas” foi gravado por Jacob do Bandolim em maio de 1957, com o regional que o acompanhava na época, o de Canhoto. Apesar da excelência com que desenvolvia suas composições, o bandolinista ainda não vivia sua época de ouro, e acabou criando um certo rancor por Waldir Azevedo, que ocupou seu lugar na Continental e obteve grande sucesso de público e crítica. Três anos depois, Jacob regravaria o choro com o acréscimo do trombone do Maestro Nelsinho. “Noites cariocas”, com seu estilo levado que remete bem ao samba, ganhou letra de Hermínio Bello de Carvalho, gravações de Ademilde Fonseca, Áurea Martins, e outras, e se tornou o maior sucesso da carreira de Jacob do Bandolim.
Doce de coco (choro, 1951) – Jacob do Bandolim e Hermínio Bello de Carvalho
O “Doce de coco” do choro de Jacob do Bandolim é o nome carinhoso pelo qual o personagem da história chama sua amada. Nos versos escritos por Hermínio Bello de Carvalho em 1980, ele implora, pede, se humilha para que ela repense o amor dos dois. Esse amor tão gostoso e irresistível que merece ser chamado de doce de coco foi gravado por Ney Matogrosso e Elizeth Cardoso.
A Ginga do Mané (choro, 1952) – Jacob do Bandolim
Jacob do Bandolim era vascaíno e compôs para o clube do coração um choro com esse mesmo nome, no qual imitava o som de uma guitarra portuguesa. Por não tão incrível que pareça, dada a personalidade controversa e interessante do instrumentista, ele compôs com igual maestria uma música para um ídolo do time rival: Mané Garrincha, o anjo das pernas tortas que chamava os marcadores de João. “A Ginga do Mané”, de 1952, é choro do menino que começou tocando violino e acabou instaurando toda uma nova história do bandolim no Brasil.
Vibrações (choro, 1967) – Jacob do Bandolim
Em 1964, Jacob do Bandolim criou o conjunto de choro que permanece para sempre na história brasileira: o Época de Ouro. Com a adesão de César Faria, pai de Paulinho da Viola e seu grande amigo, no violão de 6 cordas, Carlinhos Leite no outro violão, Dino no violão 7 cordas, Jonas no cavaquinho e Gilberto D’Ávila no pandeiro. Conjunto formado, Jacob realizou seus dois trabalhos de maior impacto: primeiro gravou “Suíte Retratos”, homenagem aos precursores da música brasileira como Pixinguinha, Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth e Anacleto de Medeiros que Radamés Gnatalli lhe dedicou. O segundo, o álbum mais aclamado de sua discografia e dono de rara hegemonia entre críticos e público: Vibrações, de 1967, que trazia entre outras, a faixa-título, uma preciosidade!
De Sérgio Bittencourt para Jacob do Bandolim: Naquela Mesa (samba-canção, 1973)
“De Sérgio Bittencourt para Jacob do Bandolim”, assim Elizeth Cardoso anuncia a homenagem emocionada do filho jornalista e compositor para o pai bandolinista. Regravada diversas vezes por grandes nomes do quilate de Nelson Gonçalves e incorporada ao repertório informal dos seresteiros, “Naquela Mesa” tornou-se clássico da canção brasileira em reverência àquele que além de músico, dedicou-se a pesquisar o choro, e transformou-se em salutar referência do gênero. À Jacob do Bandolim, “Naquela Mesa”!
Raphael Vidigal
Lido na Rádio Itatiaia por Acir Antão dia 26/02/2012.
2 Comentários
Extremamente doce a crônica musical! Me surpreendeu pelo cuidadinho artístico, a leitura tão carinhosa como técnica, terna e concreta. Amei a primeira frase e o trecho “aquele […] que dominou o choro não conteve as lágrimas”. Lindo! Beijos e sucesso no ótimo blog!
Muito obrigado, Fernanda! Sinto-me lisonjeado por seus comentários. Volte sempre! Beijos