*por Raphael Vidigal
“A manhã se dá a todos,
A noite, para alguns poucos;
A raros afortunados,
A luz da madrugada.” Emily Dickinson
“Cansamos de ouvir que o rock jamais decolaria no Brasil”, avisa Ritchie, inglês radicado no país há quatro décadas, responsável pelo sucesso pop “Menina Veneno”, que, agora, ao completar 60 anos (o aniversário foi em 6 de março), grava pela primeira vez um disco em que utiliza a língua mãe. “Todos os vocais foram registrados na primeira tomada, sem precisar de segundos ‘takes’, isso nunca tinha acontecido antes”, orgulha-se.
A celebrada data serviu de mote para que o cantor intitulasse o novo trabalho de ’60’, não apenas alusivo à particular primavera, mas como especial homenagem à efervescente década que mostrou ao mundo sucessos dos The Beatles, Rolling Stones, Beach Boys, The Animals, e outros. Todos estes estão fora do disco de Ritchie, não porque não tenham feito parte de sua adolescência musical, pelo contrário.
REPERTÓRIO
O músico explica ter optado por um repertório “menos manjado” do público tupiniquim, para “não chover no molhado”. Essas expressões tipicamente nacionais demonstram certa intimidade do cantor com o linguajar brasileiro, mas ele ainda esbarra em conjugações e troca, com frequência, o preposto feminino pelo masculino. “Para mim é mais fácil cantar em inglês”. E é dessa forma que o artista apresenta ao público canções de Paul Jones, Glen Campbell, The Lemon Pipers e Burt Bacharach, entre outros, priorizando as “de arranjos de cordas, 9 das 15 presentes no CD”, afirma.
ORIGEM
Todos esses anos de estrada não lhe tiraram do sangue a origem. Richard David Court, nome de batismo, é natural de Beckenham, no Reino Unido. “Logo quando cheguei percebi que para fazer sucesso como artista local, eu teria que cantar em português”. O primeiro professor foi o poeta Bernardo Vilhena, pertencente ao movimento marginal e parceiro de diversos músicos, como Lobão, na conhecida “Vida, louca, vida”, principalmente em razão do registro de Cazuza. Foi somente a partir do álbum ‘Circular’, o terceiro da carreira, que Ritchie dispensou o professor a tiracolo e seguiu, sozinho, a estrada.
PROFESSOR
Além de enfileirar notáveis êxitos nas rádios, como “A Vida Tem Dessas Coisas”, “Pelo Interfone”, “Casanova” e “Voo de Coração”, Ritchie trocou o papel de aluno para tornar-se mestre. Era a sua vez de retribuir a ajuda e o carinho, e empenhou-se em ensinar para Gal Costa, Egberto Gismonti e Paulo Moura, o próprio idioma. “Era bem mais divertido do que dar aulas para outros alunos, porque conversávamos, invariavelmente, sobre música”. Com Egberto e Paulo, havia um “intercâmbio”. “Trocava as aulas de inglês por aulas de música”, conta. Já Gal Costa foi quem o incentivou a adotar o português para cantar. “Sinceramente, não acreditava que pudesse dar certo”.
DESACREDITADO
Contrariando as expectativas do próprio Ritchie, cantar em português deu certo. E não apenas para ele, que começou tocando flauta na banda de rock progressivo ‘Vímana’, onde entre os parceiros célebres estavam os então desconhecidos Lobão (tocando bateria) e Lulu Santos (guitarra e vocais). Nesse período, em meados dos anos 70, não havia, segundo ele, circuito de shows, e as apresentações se restringiam ao eixo Rio-São Paulo. O motivo? “As gravadoras não acreditavam que o gênero pudesse agradar o público brasileiro”, diz.
POP ROCK
Mas esse mesmo cenário se modificou bruscamente menos de uma década depois, quando no início dos anos 80 começaram a despontar grupos que mesclavam artes cênicas, letras bem humoradas e bases elétricas. Na carona da ‘Blitz’ comandada por Evandro Mesquita vieram ‘Os Paralamas do Sucesso’, ‘Titãs’, ‘Legião Urbana’, ‘Barão Vermelho’ e ‘Kid Abelha’, todas muito diferentes entre si, mas o filão estava aberto. “Nesse período totalizamos 139 shows em 7 meses, em cidades que jamais haviam recebido um artista antes”, salienta Ritchie.
O pequeno príncipe inglês, acomodava-se, fartamente, entre os bardos brasileiros, ancorado na interação entre música pop e os acordes libertários de um insipiente rock. “A cultura pop é a porta de entrada que dá acesso às artes, falando uma língua simples e universal, facilmente compreendida por todos, capaz de mobilizar multidões. É, de certa forma, o sinal dos nossos tempos”. Resta saber se o músico refere-se aos anos 60 ou aos 2012.
Publicado no jornal “Hoje em Dia” em 17/12/2012.
9 Comentários
torço a cada dia pro rock nacional voltar em peso, cansado de ouvir os “internacionais” que chegam com tudo nas rádios e deixam escondidos o nosso bom rock nacional.
Boa Rapha!!
é isso aí,Ricardinho!!!
Rapha, sempre com boas surpresas!!! Mineirinho bommmmmmmm!
“Mas esse mesmo cenário se modificou bruscamente menos de uma década depois, quando no início dos anos 80 começaram a despontar grupos que mesclavam artes cênicas, letras bem humoradas e bases elétricas. Na carona da ‘Blitz’ comandada por Evandro Mesquita vieram ‘Os Paralamas do Sucesso’, ‘Titãs’, ‘Legião Urbana’, ‘Barão Vermelho’ e ‘Kid Abelha’, todas muito diferentes entre si, mas o filão estava aberto. “Nesse período totalizamos 139 shows em 7 meses, em cidades que jamais haviam recebido um artista antes”, salienta Ritchie.”
não sabia que Ritchie era inglês
Rock é Rock o resto é resto
Que bom ve-lo e ouví-lo novamente. Estava com saudades…
Parabéns, Raphael! Bjos
nao acreditttooooooooooo !!! fala pra ele que eu acho ele linnnndo!!!!!